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TRE, Ac. de 7 de Junho de 2016

TRE, Ac. de 7 de Junho de 2016

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Tribunal da Relação de Évora, Acórdão de 7 Jun. 2016, Processo 529/1/

Relator: MARIA LEONOR ESTEVES.

Processo: 529/1/

JusNet 3938/2016

A expressão "ou paras de chatear meu filho ou vou-te dar a reforma mais cedo", ainda que tenha sido proferida de forma intimidatória e no seio de uma discussão, não consubstancia um anúncio de morte

Resumo

AMEAÇA. AGRAVAÇÃO DO CRIME. O tipo legal do crime de ameaça tem como elementos constitutivos o anúncio de que o agente pretende infligir a outrem um mal que constitui crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor, a adequação da ameaça a provocar ao visado medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, e o dolo genérico, em qualquer das suas modalidades. No caso dos autos, a expressão "ou paras de chatear meu filho ou vou-te dar a reforma mais cedo", ainda que tenha sido proferida de forma intimidatória e no seio de uma discussão, não é compatível com a morte. Com efeito, prometer uma antecipação da reforma, mesmo que seja adequada a causar inquietação e receio de que possa vir a ser concretizada, não consubstancia a prática do crime de ameaça.

Disposições aplicadas

DL n.º 400/82, de 23 de Setembro (Código Penal) (JusNet 10/1982) art. 153

Meio processual

1.º Juízo do Tribunal Judicial da Comarca de Lagos

Jurisprudência relacionada

TRP, Ac. de 22 de Janeiro de 2003 (JusNet 553/2003)

TRP, Ac. de 16 de Fevereiro de 2000 (JusNet 1270/2000)

TRP, Ac. de 25 de Setembro de 2002 (JusNet 4982/2002)

TRP, Ac. de 28 de Maio de 2003 (JusNet 3639/2003)

Ver JurisprudênciaTRP, Ac. de 23 de Fevereiro de 2005 (JusNet 1153/2005)

Ver JurisprudênciaTRP, Ac. de 17 de Novembro de 2004 (JusNet 5649/2004)

Ver JurisprudênciaTRL, Ac. de 11 de Dezembro de 2003 (JusNet 6470/2003)

Ver JurisprudênciaTRP, Ac. de 30 de Março de 2005 (JusNet 1891/2005)

Ver JurisprudênciaTC, Ac. de 9 de Fevereiro de 1999 (JusNet 9123/1999)

Ver JurisprudênciaTRP, Ac. de 25 de Janeiro de 2006 (JusNet 576/2006)

Ver JurisprudênciaTRP, Ac. de 17 de Maio de 2006 (JusNet 3621/2006)

Ver JurisprudênciaTRP, Ac. de 20 de Dezembro de 2006 (JusNet 6629/2006)

Ver JurisprudênciaTRP, Ac. de 28 de Novembro de 2007 (JusNet 6929/2007)

Ver JurisprudênciaTRG, Ac. de 7 de Janeiro de 2008 (JusNet 939/2008)

Ver JurisprudênciaTRP, Ac. de 28 de Maio de 2008 (JusNet 2461/2008)

Ver JurisprudênciaSTJ, Ac. de 12 de Junho de 2008 (JusNet 2865/2008)

Ver JurisprudênciaTRC, Secção Criminal, Ac. de 23 de Setembro de 2009 (JusNet 5895/2009)

Ver JurisprudênciaTRC, Ac. de 9 de Setembro de 2009 (JusNet 5907/2009)

Ver JurisprudênciaTRG, Ac. de 18 de Maio de 2009 (JusNet 6525/2009)

Ver JurisprudênciaTRG, Ac. de 1 de Fevereiro de 2010 (JusNet 832/2010)

Ver JurisprudênciaTRL, Ac. de 11 de Fevereiro de 2010 (JusNet 838/2010)

Ver JurisprudênciaTRL, Ac. de 9 de Março de 2010 (JusNet 1387/2010)

Ver JurisprudênciaTRP, Ac. de 2 de Junho de 2010 (JusNet 3498/2010)

Ver JurisprudênciaTRP, Ac. de 22 de Junho de 2011 (JusNet 3936/2011)

Ver JurisprudênciaTRE, Ac. de 6 de Setembro de 2011 (JusNet 4653/2011)

Ver JurisprudênciaTRC, Ac. de 7 de Março de 2012 (JusNet 1854/2012)

Ver JurisprudênciaTRC, Ac. de 30 de Maio de 2012 (JusNet 3746/2012)

Ver JurisprudênciaTRP, Secção Criminal, Ac. de 7 de Março de 2012 (JusNet 4607/2012)

Ver JurisprudênciaSTJ, Ac. de 20 de Fevereiro de 2013 (JusNet 1276/2013)

Ver JurisprudênciaTRE, Ac. de 30 de Setembro de 2014 (JusNet 6255/2014)

Ver JurisprudênciaTRE, Ac. de 17 de Março de 2015 (JusNet 1794/2015)

Texto

Acordam, em conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora:

1.Relatório

No 1º juízo do Tribunal Judicial da comarca de Lagos, em processo comum com intervenção do tribunal singular, foram submetidos a julgamento os arguidos RM., BR. e AJ., devidamente identificados nos autos, tendo no final sido proferida sentença, na qual se decidiu condená-los: ao primeiro, pela prática de um crime ofensa à integridade física, p. e p. pelo art. 143º no 1, um crime de ameaça agravada, p. e p. pelos arts. 153º no 1 e 155º no 1 al. a), e um crime de injúria, p. e p. pelo art. 181º, todos do C. Penal, nas penas parcelares de, respectivamente, 9 meses, 6 meses e 2 meses de prisão, todas a substituir por multa, e, em cúmulo jurídico, na pena única de 1 ano de prisão, substituída por 365 dias de multa à taxa diária de 7,5€ de prisão; à segunda, pela prática de um crime de injúria, p. e p. pelo art. 181º do C. Penal, na pena de 90 dias de multa à taxa diária de 7,5€; e o terceiro, pela prática de um crime de ameaça agravada, p. e p. pelos arts. 153º no 1 e 155º no 1 al. a) do C. Penal, na pena de 180 dias de multa à taxa diária de 7,5€.

Na procedência total do pedido indemnizatório que contra os arguidos foi deduzido pelo ofendido/assistente, A. foram os demandados condenados, solidariamente, a pagar ao demandante, a quantia de 5.000 €, a título de compensação por danos não patrimoniais.

Inconformados com a sentença, dela interpuseram recurso os arguidos, pugnando pela anulação da mesma e consequente reenvio para novo julgamento ou, assim se não entendendo, pela sua alteração nos termos de facto e de direito defendidos e consequente absolvição dos arguidos ou, pelo menos, pela redução da pena para os mínimos legais e absolvição do pedido cível, para o que apresentaram as seguintes conclusões:

1- Refere claramente e sem margem para dúvida, a sentença ora recorrida, que a prova assenta entre outras, nas fotografias de folhas 126 e seguintes.

2- Estabelece o artº 355 do CPP:

"1. Não valem em julgamento, nomeadamente para o efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência."

" 2. Ressalvam-se do disposto no número anterior as provas contidas em actos processuais cuja leitura, visualização ou audição em audiência sejam permitidas, nos termos dos artigos seguintes."

3- Em nenhuma das actas das audiências constantes dos autos e respeitantes às audiências de julgamento que tiveram lugar nos presentes autos, consta que tais fotografias tenham sido objecto de apreciação e bem assim alvo de contraditório, nem tendo as mesmas sido notificadas aos arguidos.

4- A sua valoração encontra-se legalmente proibida, encontrando-se consequentemente vedada de todo a sua apreciação, por ter sido valorada enferma a douta sentença do vício da nulidade, como bem se encontra expresso no no 9 do artº 356º do CPP.

5- Violou assim, a douta sentença recorrida por erro de interpretação e de aplicação o estabelecido pelos artºs. 355º e 356º ambos do CPP.

6- Estabelece o no 1 do art.º 122º do CPP que:

"1. As nulidades tornam inválido o acto em que se verificarem, bem como os que dele dependerem e aquelas puderem afectar."

7- Encontra-se a douta sentença ferida de nulidade, pelo que terá a mesma de ser declarada nula, devendo consequentemente ser anulado o julgamento e determinado o reenvio do processo nos termos do no 1 do artº 426 do CPP.

Caso V. Exas. assim não entendam, por dever de patrocínio impõe-se referir que,

8- O tribunal é livre de apreciar a prova, mas no caso sub Júdice, os factos dados como provados estão, salvo mais douta opinião, em clara contradição com a prova que se encontra gravada.

9- Vejamos o depoimento do ofendido e assistente A., do qual se transcrevem alguns excertos (ficheiro de áudio: 0130522120152_138897_64467):

Mmo. Dr. Juiz: "Diga lá então o que é que se passou?"

Assistente: "Mmo. Juiz eu abri um estabelecimento no Chinicato onde tive este estabelecimento durante três anos, no primeiro ano as coisas correram normais, dentro da normalidade. Passado esse ano começaram a aparecer coisas muito estranhas no meu estabelecimento. Sem eu ter inimigos, sem conhecer as pessoas de lado nenhum. A tentar agradar sempre a toda a gente. Do tipo, eu chegar ali de manhã e a minha pastelaria ter as paredes todas pintadas. Sacos de lixo derramados no hall da entrada da pastelaria. Os vidros todos partidos. Desculpe a expressão, preservativos pendurados nas portas. Tudo mais. E eu, meu Deus, o que é que se passa quem é que me anda a fazer estas coisas?"

Assistente: "Por volta das 9, 9:30 da manhã encontrei o Sr. Rui e disse-lhe - Ó Rui eu gostava que me dissesses se sabes quem é que partiu o vidro às 2:30 da manhã porque esse indivíduo parou ao pé da tua janela, podes-me dizer quem é que partiu o vidro por favor?"

Assistente: No dia 06 eram por volta das 4:30 da tarde eu estava sentado ali tinha ali quatro mesinhas, numa espanadazinha ali à entrada da pastelaria e eu tava ali a estava a fumar um cigarro o Sr. Rui aproximou-se a 50 metros de distância e disse-me:

- Vamos ali para uma fazenda que é hoje que eu te mato! Vá anda se és homem. A desafiar-me." (O negrito é nosso)

Mmo. Dr. Juiz: "Durante quanto tempo para além destes factos é que o ofendido/assistente continuou a explorar a pastelaria?"

Assistente: "Não posso precisar quanto tempo, cerca de nove meses, não posso dizer sem ver os documentos."

Mmo. Dr. Juiz: "Mais nove meses portanto?"

Asistente: "Não posso precisar, não sei meritíssimo mas poderá andar entre os nove meses e um ano, eu não me lembro, mas cerca de um ano, podemos apontar cerca de um ano."

Mmo. Dr. Juiz: "Quem é que abria o estabelecimento comercial e que é que o fechava?"

Assistente: "Quando eu tinha funcionária umas vezes abria ela outras vezes abria eu. Quando deixei de ter funcionária abria eu e fechava. Levava ali de manhã à noite."

Assistente: "Depois da data dos acontecimentos abria e fechava o estabelecimento normalmente. Não andava com guarda-costas porque eu sou homem igual a este senhor que está aqui atrás. Não tenho medo nenhum dele. Ao contrário do que ele possa pensar. Acho que é nesta sala que se faz justiça. Sei-me defender mas ninguém tá acima da lei. (O negrito é nosso)

Mmo. Dr. Juiz : "A que horas é que o senhor abria o estabelecimento e a que horas é que o fechava?"

Assistente: "O estabelecimento funcionava a partir das 7 da manhã eu chegava ali por volta dos 10, 15 prás 7 às vezes chegava às 5 prás 7. Fechava às 11, 11:30. No dia dos jogos lá fecharia um pouco mais tarde. Depois tínhamos de fazer a limpeza."

Assistente: "A culpa de eu me ter divorciado não foi do Sr. Rui, como é lógico. Mas isto tudo causou instabilidade na minha família. Tinha uma filha, tenho uma filha, pequena, na altura ela tinha 3 anos de idade. Havia discussões, havia desentendimentos. Ela perguntava-me: "Será que esta noite fazem alguma coisa à pastelaria? A gente já não dormia. Chegávamos ali de manhã, ela trabalha ali no supermercado no Intermarché. Abalava de manhã antes de ir entrava dentro do Chinicato a ver se a pastelaria estava pintada, para me telefonar. Havia um clima entre nós que aquilo a gente andávamos todos com medo. A carrinha do meu sogro os vidros apareceram partidos. Não podemos acusar, a gente não sabe, não viu, não acusamos ninguém. Um carro que eu tinha apareceu-me todo riscado, um carro novo."

10- Das declarações supra resulta claramente que a pretensão do assistente na condenação dos arguidos fundamentava-se em factos não denunciados e não provados, de vandalismo exercidos sobre a pastelaria e os carros que ocorreram antes dos factos descritos nas acusações e cuja autoria não foi possível aferir, vindo o aqui assistente juntar ardilosamente estes acontecimentos com o que se passou entre ele e os arguidos, por forma a ser feita justiça ainda que contra inocentes.

11- Considerando as supra transcritas declarações do assistente entendem os recorrentes que não podia o Mmo. Dr. Juiz "a quo" ter dado como provado:

1- Relativamente ao arguido Rui que:

"3p. O Assistente reagiu, pedindo-lhes que abandonassem o estabelecimento, quando o arguido Rui contornou o balcão, colocou as mãos no peito do Assistente e empurrou-o contra a máquina registadora, causando-lhe dores no peito e nas costas.

4p. O arguido Rui foi, depois, separado do Assistente pela arguida Bruna e por um circunstante, e ao ser retirado do estabelecimento, virou-se e disse para aquele "vou-te rebentar os cornos todos, vou rebentar contigo".

5p. O arguido Rui agiu de molde a causar ao Assistente as provadas dores.

8p. No dia 6 de Novembro de 2010, antes dos factos provados em 1p, 2p, 3p e 4p, o arguido Rui disse ao Assistente "vamos ali para uma fazenda, que é hoje que eu te mato, desliga as câmaras."

12- Para depois concluir que ao agir como supra descrito o arguido praticou um crime de ameaça agravada.

13- Entende o recorrente Rui que os factos que praticou não preenchem os três elementos essenciais do tipo objectivo de ilícito, apenas preenchem dois dos elementos essenciais do tipo objectivo de ilícito: traduz um mal cuja ocorrência depende da vontade do agente, mas não é um mal futuro é um mal iminente.

14- Atente-se no teor das expressões proferidas:

"Vamos ali para uma fazenda, que é hoje que eu te mato, desliga as câmaras."

15- Trata-se claramente da ameaça de um mal iminente temporalmente balizado pelo arguido Rui.

16- O mesmo se diga da expressão, "vou-te rebentar os cornos todos, vou rebentar contigo", a qual tem de ser contextualizada com o que se passava dentro do estabelecimento nessa altura, e que aparece descrito da seguinte maneira; quando o arguido Rui contornou o balcão, colocou as mãos no peito do Assistente e empurrou-o contra a máquina registadora, causando-lhe dores no peito e nas costas.

17- Tendo depois sido separado do Assistente pela arguida Bruna e por um circunstante, e ao ser retirado do estabelecimento e enquanto se procurava soltar o arguido Rui dizia "vou-te rebentar os cornos todos, vou rebentar contigo".

18- E tanto que o arguido Rui queria cumprir imediatamente com o que dizia que teve de ser separado do assistente depois de o ter empurrado, altura em que exibiu a sua agressividade para com o ofendido.

19- Neste sentido também já se pronunciaram:

- A Relação de Coimbra no acórdão 366/10.4GCTND.C1 no qual se menciona também o acórdão do Tribunal da Relação do Porto, processo:0414654, no convencional: JTRP0037380 de 17-11-2004:

"se a "ameaça" for de um mal a consumar no momento ("eu mato-te", pegando e vibrando no ar o cabo de uma enxada que transportava) porque ou a ameaça entra no campo da tentativa do crime integrado pelo mal objeto da ameaça ou, não entrando, logo se esgota na não consumação do mal anunciado, do que resulta não ter ficado o visado condicionado nas suas decisões e movimentos dali por diante."

- "Mais, ainda que assim não se entenda, deve então concluir-se como no Ac. Tribunal da Relação do Porto, Rec. Penal no 2940/08.0TAVNG.Pl- 4ª Sec. Data - 25/03/2010:

"A ameaça com um anúncio de morte, genericamente formulado, sem qualquer concretização quanto aos meios a empregar, cabe apenas na previsão do no 1 do Artigo 153 do Código Penal" Foi assim violado o disposto nos artigos 153, 155 no 1 a) do C. Penal, 32 no 2 da CRP, e artigos 129, 358 e 359 e 410 no 2 al. c) do CPP.

Deve dar-se provimento ao recurso, julgando-se improcedente a acusação e consequentemente absolver-se o arguido da prática do crime de ameaça agravada."

- A Relação do Porto no Acórdão no TRP_0712156 de 28-11-2007 sublinhando a distinção entre a ameaça de um mal futuro e a ameaça de um mal eminente.

"- Sendo o crime de ameaça "um crime contra a liberdade pessoal (liberdade de decisão e de acção) ... a conduta típica deve gerar insegurança, intranquilidade ou medo no visado, de modo a condicionar as suas decisões e movimentos dali em diante. E isso não acontecerá se a ameaça for de um mal a consumar no momento, porque ou a ameaça entra no campo da tentativa do crime integrado pelo mal objecto da ameaça, sendo nesse caso a conduta punível como tentativa desse crime, se a tentativa for punível, ou não entra e, então, a ameaça logo se esgota na não consumação do mal anunciado, do que resulta não ficar o visado condicionado nas suas decisões e movimentos dali para a frente" - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 17-11-2004, processo 0414654, citado no Acórdão de 20-12-2006, proferido no processo 0645320;

- "Ora, para que se dê por preenchido o tipo objectivo do crime de ameaça, é necessário, desde logo, que o mal ameaçado seja futuro. O mal, objecto da ameaça, não pode ser iminente, pois que, neste caso, estar-se-á diante de uma tentativa de execução do respectivo acto violento, isto é, do respectivo mal". - Acórdão do Tribunal da Relação do Porto, de 25-01-2006, proferido no processo 0544124.

No caso em apreço, as expressões usadas pelo arguido, relativamente ao elemento temporal em análise, não se projectam sobre o futuro, mas sobre o presente: "Vai ser hoje o vosso fim...". Esta expressão mostra de forma indiscutível que o agente queria exibir a sua agressividade ao ofendido, mostrando-se disponível para o matar naquele mesmo dia. As palavras seguintes "... e atirar com eles ao rio", proferidas junto a uma ponte (como era o caso), mostram que o mal ameaçado (morte) estava a ser enunciado e anunciado para ser praticado ali, naquele dia e naquele local.

É por isso certo e seguro que as palavras dadas como provadas, apesar de traduzirem a ameaça de um mal, não traduzem a ameaça de um mal futuro e, por isso, não preenchem o tipo objectivo de ilícito previsto no art. 153º do C. Penal.

Deste modo e por não se verificar um dos elementos objectivos do tipo de ilícito (ameaça de um mal futuro), impõe-se a absolvição do arguido."

20- A igual decisão deveria o Mmo. Dr. Juiz "a quo" e nunca deveriam tais expressões terem contribuído para a condenação do arguido pelo crime de ameaça agravada.

21- A isto acresce que da prova gravada resulta claramente que o assistente entendeu as palavras que o arguido Rui proferiu no dia 06 como um desafio e não como uma ameaça e a nossa lei penal, por ora ainda não pune os desafios.

22- Embora o assistente tenha começado por dizer que ficou com medo das ameaças do arguido Rui, logo referiu, de forma espontânea que era tão homem como ele, que se sabia defender e que não tinha medo dele.

23- Que abria e fechava a pastelaria sozinho, chegando a abrir às 7 da manhã e a fechar às 11 da noite e que o continuou a fazer durante cerca de uma ano, altura em que resolveu fechar o estabelecimento.

24- Pelo que não deveria o Mmo. Dr. Juiz "a quo" ter dado como provado, como deu, que o assistente temeu pela sua vida, tendo ficado assustado e que a sua tranquilidade ficou afectada.

25- Resultando das declarações consequentes o contrário, uma vez que o mesmo continuou a fazer a sua vida normalmente durante cerca de um ano para além da data dos factos descritos nas acusações particulares e do Ministério Público e se porventura não tivesse decidido fechar a pastelaria que explorava ou não se tivesse divorciado, a sua esposa é que era do Chinicato, ele ainda hoje aí permaneceria.

26- Não se pode concluir que a pastelaria fechou um ano depois por causa daqueles factos, os quais foram pontuais e não se voltaram a repetir.

27- O mesmo se diga do divórcio do assistente poder ter sido de alguma forma consequência das ameaças dos arguidos Rui e Amândio.

28- Sejamos claros, o assistente logo no início das suas declarações, a instâncias do Mmo. Dr. Juiz "a quo" explicou do que é que ele se queixava:

Mmo. Dr. Juiz: "Diga lá então o que é que se passou?"

Assistente: "Mm. Juiz eu abri um estabelecimento no Chinicato onde tive este estabelecimento durante três anos, no primeiro ano as coisas correram normais, dentro da normalidade. Passado esse ano começaram a aparecer coisas muito estranhas no meu estabelecimento. Sem eu ter inimigos, sem conhecer as pessoas de lado nenhum. A tentar agradar sempre a toda a gente. Do tipo, eu chegar ali de manhã e a minha pastelaria ter as paredes todas pintadas. Sacos de lixo derramados no hall da entrada da pastelaria. Os vidros todos partidos. Desculpe a expressão, preservativos pendurados nas portas. Tudo mais. E eu, meu Deus, o que é que se passa quem é que me anda a fazer estas coisas?"

29- Para depois acrescentar,

Assistente: "A culpa de eu me ter divorciado não foi do Sr. Rui, como é lógico. Mas isto tudo causou instabilidade na minha família. Tinha uma filha, tenho uma filha, pequena, na altura ela tinha 3 anos de idade. Havia discussões, havia desentendimentos. Ela perguntava-me: "Será que esta noite fazem alguma coisa há pastelaria? A gente já não dormia. Chegávamos ali de manhã, ela trabalha ali no supermercado no Intermarché. Abalava de manhã antes de ir e entrava dentro do Chinicato a ver se a pastelaria estava pintada, para me telefonar. Havia um clima entre nós que aquilo a gente andávamos todos com medo. A carrinha do meu sogro os vidros apareceram partidos. Não podemos acusar, a gente não sabe. A gente não viu. Não acusamos ninguém. Um carro que eu tinha apareceu-me todo riscado, um carro novo." (O negrito é nosso)

Assistente: "Por volta das 9, 9:30 da manhã encontrei o Sr. Rui e disse-lhe - Ó Rui eu gostava que me dissesses se sabes quem é que partiu o vidro às 2:30 da manhã porque esse indivíduo parou ao pé da tua janela, podes-me dizer quem é que partiu o vidro por favor?" (O negrito é nosso)

30- Destas declarações resulta bem claro que o receio que o assistente disse que ele e a sua família, mormente a sua esposa, sentiam não estava directamente relacionado com as ameaças do arguido Rui, ou do arguido Amândio, mas sim com o receio que os seus bens materiais, carros e edifício onde funcionava a pastelaria pudessem ser danificados, por alguém que ele dizia desconhecer, mas que no seu entender e nas entrelinhas recaia nos aqui recorrentes.

31- E tanto assim é que o assistente nas suas declarações confirmou ter confrontado o arguido Rui com a autoria dos prejuízos que disse ter sofrido.

32- Situação que não se encontrava em discussão nos presentes autos.

33- Entendem os arguidos Rui e Amândio que quando o Mmo. Dr. Juiz "a quo" escreve que:

"...o Assistente disse ainda que o clima criado lhe tirou clientes, e acresceu a outros factores, que tiveram o seu desfecho com o seu divórcio e o encerramento do estabelecimento em questão; salientou, porém, referindo-se a si e à, sua família, "andávamos todos com medo"."

34- Tal facto não é correcto, pois a afirmação "andávamos todos com medo" não é relativa às ameaças dos arguidos Rui e Amândio mas sim, como supra se deixou exposto, ao receio que os bens materiais pertencentes ao assistente e aos seus familiares aparecessem danificados. Basta atentar nas declarações do assistente.

35- Não deveria ter sido dado tal facto como provado pois encontra-se em clara contradição com a prova produzida em sede de discussão de audiência de julgamento.

36- Consequentemente deveria o arguido ter sido absolvido do crime de ameaça na sua forma agravada.

Se assim não se entender, à cautela sempre se dirá que,

37- A qualificação jurídica dada pelo Mmo. Dr. Juiz "a quo" às expressões proferidas pelo arguido Rui, ao condená-lo como autor material de um crime doloso consumado de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153, no 1, e 155º, no 1, alínea a), do Código Penal, não foi correcta, porquanto é jurisprudência comum entre os tribunais superiores que a ameaça com um anúncio de morte, genericamente formulado, sem qualquer concretização quanto aos meios a empregar, não pode deixar de estar prevista, tão só, no no 1 do artº 153º do CP.

38- A previsão de crime agravado pela al. a) do artº 155º, do CP tem de dirigir-se àqueles casos em que a descrição dos meios mediante os quais a ameaça - no caso, contra a vida - se poderá vir a concretizar, configura um crime da previsão do artº 155º, no 1, al. a), do CP.

39- Nas expressões que lhe são imputadas nunca o arguido Rui concretizou quais os meios a empregar, mas porque presente e eminente, sem que o recorrente tivesse ao seu dispor qualquer arma, se resumia, como se resumiu à sua força física, pelo que a conduta do arguido Rui não pode em abstracto, a configurar um crime de ameaça, com o que discordamos com os argumentos já aduzidos, não pode deixar de apenas configurar o crime de ameaça nos termos do artº 153º do CP.

40- Nesse sentido já se decidiu no Ac. Tribunal da Relação do Porto, Rec. Penal no 2940/08.0TAVNG.Pl- 4ª Sec. Data - 25/03/2010:

"A ameaça com um anúncio de morte, genericamente formulado, sem qualquer concretização quanto aos meios a empregar, cabe apenas na previsão do no 1 do Artigo 153 do Código Penal."

41- Ao decidir como fez violou o Mmo. Dr. Juiz "a quo" quer por erro de interpretação, quer por erro de aplicação o constante no artº 155 no 1 al. a) do CP.

42- Quanto ao recorrente Amândio o Mmo. Dr. Juiz "a quo" começa por dizer que este interveio num contexto acidental, levado pela força dos laços de família, e querendo somente fazer causa comum com o seu filho Rui.

43- Para depois escrever que:

"O arguido Amândio não é, em abstracto, menos temível do que seu filho, apesar de ser nascido em 1946, pois a morte, quando querida e planeada, não ocorre em confronto directo, de luta até morte", ou outro tipo de teatralidade; o que acontece, no cumprimento de uma ameaça de morte, é o ataque de surpresa, a facada ou o tiro, a emboscada, a espera - é esta perspectiva que infunde medo, o medo que levou o Assistente a vir ao Tribunal pedir justiça." (O negrito é nosso)

44- E ainda que,

"O arguido Amândio, ao prometer "uma reforma antecipada", profere uma clara e perigosa ameaça de morte, porventura mais de temer do que a de seu filho, pois é legítimo que o ameaçado espere dele o efectivo cumprimento do que promete, já porque só pode cumpri-lo furtivamente, mediante o uso de arma de fogo, já porque a sua idade lhe permite encarar com uma tranquilidade relativa o cumprimento de uma pena de prisão por homicídio; estes dados, imanentes à condição pessoal deste arguido tornam a sua ameaça a mais séria e temível das que se mostram nos autos." (O negrito é nosso)

45- Perante as considerações do Mmo. Dr. Juiz o arguido Amândio ficou estupefacto, desde logo porque:

- em momento algum do julgamento se provou que o arguido Amândio tivesse algum plano para matar o assistente;

- ou que fosse detentor de qualquer faca ou arma de fogo com que pudesse concretizar a ameaça;

- relativamente ao medo sentido pelo assistente, já supra se explanou o que os recorrentes entendem sobre esse dito "medo";

- mas o que realmente surpreendeu o arguido Amândio foi o facto de o Mmo. Dr. Juiz "a quo" o ter considerado como sendo um criminoso em potência, alguém a quem a sua idade lhe permite encarar com uma tranquilidade relativa o cumprimento de uma pena de prisão por homicídio!

46- Tal juízo, para além de profundamente violador da Constituição da República Portuguesa, ao violar o princípio da igualdade, tal como este está estabelecido no artigo 13.º da Constituição da República Portuguesa.

47- Pois considera-se que alguém é mais ou menos perigoso não em função da sua vivência social e passado criminal mas tão somente pela sua idade, como se fosse legítimo afirmar que qualquer pessoa acima de determinada idade é um criminoso em potência, porque já viveu o que tinha a viver e assim sendo quase que encara a perspectiva de uma pena de prisão, ainda mais por um crime de homicídio, "com um sorriso nos lábios!"

48- Esta consideração por parte do Mmo. Dr. Juiz é no entender do recorrente Amândio completamente desprovida de fundamento, seja ele factual ou legal e até contraditória com o explanado no seu relatório social, no qual o Mmo. Dr. Juiz "a quo" afirma se ter baseado para fundamentar a pena que lhe foi aplicada, no qual é referido que:

"Amândio ... é um indivíduo social e familiarmente inserido na comunidade onde reside. O presente processo surge isolado no seu percurso vivencial, mostrando ter interiorizado a noção do interdito, revelando capacidade em organizar-se."

49- Nesse sentido também as declarações das testemunhas por si arroladas, que o Mmo. Dr. Juiz "a quo" afirma ter valorado, as quais descreveram os arguidos como boas pessoas, avessas a criarem desordem.

50- Sendo contraditória a prova produzida e valorada na qual o Mmo. Dr. Juiz "a quo" alega ter alicerçado a sua convicção, com a factualidade dada como provada e com a fundamentação em que o Mmº. Dr. Juiz alicerça a medida da pena.

51- Entendeu o Mmo. Dr. Juiz "a quo" em condenar o arguido Amândio por autoria material de um crime doloso consumado de ameaça agravada, previsto e punido pelos artigos 153º, no 1, e 155º, no 1, alínea a), do Código Penal.

52- Na opinião do arguido aqui recorrente tal aplicação da lei criminal aos factos considerados como ter sido por si praticados não foi correcta, porquanto é jurisprudência comum entre os tribunais superiores que a ameaça com um anúncio de morte, genericamente formulado, sem qualquer concretização quanto aos meios a empregar, não pode deixar de estar prevista, tão só, no no 1 do artº 153º do CP.

53- A previsão de crime agravado pela al. a) do artº 155º, do CP tem de dirigir-se àqueles casos em que a descrição dos meios mediante os quais a ameaça - no caso, contra a vida - se poderá vir a concretizar, configura um crime da previsão do artº 155º, no 1, al. a), do CP.

53- A expressão proferida pelo arguido Amândio e que consta dos factos provados foi tão só:

-"Ou páras de chatear o meu filho ou vou-te dar a reforma mais cedo!"

54- Ora, não tendo havido qualquer concretização quanto aos meios a empregar, a conduta do arguido Amândio não pode deixar de configurar tão só o crime de ameaça nos termos do artº 153º do CP, concluindo-se como no Ac. Tribunal da Relação do Porto, Rec. Penal no 2940/08.0TAVNG.Pl- 4ª Sec. Data - 25/03/2010: "A ameaça com um anúncio de morte, genericamente formulado, sem qualquer concretização quanto aos meios a empregar, cabe apenas na previsão do no 1 do Artigo 153 do Código Penal".

55- Pelo que ao decidir como fez violou o Mmo. Dr. Juiz "a quo" quer por erro de interpretação, quer por erro de aplicação o constante no artº 155 no 1 al. a) do CP.

56- Durante a inquirição do assistente procurou o aqui signatário inteirar-se dos reais "receios" do mesmo perante as tais "ameaças" de que dizia ter sido vítima, para tentar compreender de que forma tais receios afetaram a sua tranquilidade.

57- Nesse sentido, conforme resulta da prova gravada, foi perguntado o seguinte:

Dr. P:"O Sr. ofendido já aqui disse que não tinha medo do arguido Rui, porque se sabia defender. Gostaria que lhe fosse perguntado se tem medo da arguida Bruna e do arguido Amândio."

58- Para espanto do aqui signatário o Mmo. Dr. Juiz "a quo" respondeu o seguinte:

Dr. Juiz: "Eu não lhe vou perguntar isso Sr. Dr. ele aí já falou de mais. E eu não vou pô-lo a falar de mais ainda mais. Portanto isso não lhe vou perguntar. É indiferente que ele tenha medo ou não tenha medo das pessoas. O que interessa aqui são as circunstâncias objectivas e não se ele subjectivamente tem medo ou não tem." (O negrito é nosso)

59- Ficará para sempre no ar a seguinte questão:

- O que é que o Mmo. Dr. Juiz "a quo" quis dizer quando disse que o assistente já tinha falado demais?

60- Até porque na douta sentença o Mmo. Dr Juiz "a quo" não se refere a este falar de mais...O que não é menos de estranhar.

61- Não conseguem compreender os arguidos o porquê do Mmo. Dr. Juiz "a quo" ter assumido tal posição de parcialidade coartando o direito ao contraditório e impedindo um cabal esclarecimento sobre a eventual verificação dos requisitos necessários para preenchimento do crime de ameaças.

62- Consideram os arguidos que ao decidir como fez, violou o Mmo. Dr. Juiz "a quo" o princípio do contraditório e o principio da imparcialidade, pedras basilares do nosso direito penal, sendo princípios que têm consagração constitucional.

63- O da imparcialidade significa que a administração da justiça não é possível sem um Tribunal independente e imparcial, a imparcialidade do Tribunal constitui um requisito fundamental do processo justo.

64- Na perspectiva das partes, as garantias de imparcialidade referem-se à independência do juiz e à sua neutralidade perante o objecto em causa.

65- O do contraditório no art. 32º no 5 da Constituição da República Portuguesa e significa que:

"nenhuma prova deve ser aceite em audiência, nem nenhuma decisão (mesmo interlocutória) deve ser tomada pelo juiz, sem que previamente tenha sido dada ampla e efectiva possibilidade ao sujeito processual contra o qual é dirigida de a discutir, de a contestar e de a valorar".

"No que respeita especificamente à produção de provas, o princípio exige que toda a prova deva ser, por regra, produzida em audiência pública e segundo um procedimento adversarial".

66- Consideram os arguidos que o Tribunal "a quo", tendo em conta os factos provados, lhes aplicou uma pena demasiado gravosa, tendo-os penalizado duramente.

67- Tendo violado por erro de aplicação e de interpretação, o art. 71 no 2 do CP, onde se encontram plasmados os requisitos para determinação da medida da pena, mormente aqueles que os arguidos entendem que não foram levados em consideração pelo Mmo. Dr. Juiz "a quo", a saber:

a) O grau de ilicitude do facto, o modo de execução deste e a gravidade das suas consequências, bem como o grau de violação dos deveres impostos ao agente;

b) A intensidade do dolo ou da negligência:

c) Os sentimentos manifestados no cometimento do crime e os fins ou motivos que o determinaram;

d) As condições pessoais do agente e a sua situação económica;

68- Ao não ter levado em consideração as condições económicas dos arguidos, mormente nos casos dos arguidos Rui e Amândio violou o Mmo. Dr. Juiz "a quo" o supra referido artigo.

69- Da mesma forma também não considerou o Mmo. Dr. Juiz "a quo" as sugestões constantes dos respectivos relatórios sociais, em ambos os casos sugere-se que lhes seja aplicada uma medida não privativa da liberdade que não seja economicamente onerosa, considerando os parcos proventos auferidos, sendo que o arguido Rui não tem rendimentos residindo com o pai, e com ele repartindo os parcos rendimentos auferidos pelo arguido Amândio, que recebe uma reforma "de miséria" de 372 Euros, cfr. melhor consta do relatório social.

70- No caso da arguida Bruna deveria o Mmo. Dr. Juiz "a quo" ter atentado, melhor naquilo que doutamente considerou, que:

- "...a sua conduta assumiu uma gravidade relativa, por assim dizer num coro de homens, a que juntou a sua voz de mulher."

71- Facto essencial para a determinação da medida da pena, neste caso dos dias de multa que lhe foram aplicados, noventa, os quais são manifestamente exagerados.

72- O mesmo se diga relativamente aos arguidos Rui e Amândio, os quais como supra se deixou explanado, a serem condenados, posição com a qual se discorda, deveriam tê-lo sido pelo crime de ameaça na sua forma simples.

73- Tal facto tem necessariamente de ser levado em consideração para determinação da medida da pena.

74- As penas aplicadas deveriam ter sido mais próximas dos mínimos legais.

75- As condições económicas deveriam ter sido melhor valoradas para a escolha do quantitativo diário.

76- O que não aconteceu, tendo a todos os arguidos sido aplicado o mesmo quantitativo de 7,5 Euros.

77- Valor com o qual não se pode concordar por ser completamente desfasado das reais condições económicas dos arguidos, mormente nos casos dos arguidos Rui e Amândio, atentas as parcas condições económicas destes arguidos o montante diário não deveria ser superior a € 5,00, montante mínimo e já por si bastante penoso.

78- Tornando o pagamento da pena de multa em que foram condenados, praticamente impossível e quase "condenando os arguidos ao cumprimento de uma pena de prisão", na qual por não se verificarem os requisitos não foram condenados.

79- Consideram assim os recorrentes que a douta sentença violou por erro de interpretação e aplicação o estatuído no art. 71º C P.

80- Por todo o supra exposto não podem os arguidos deixar de mostrar a sua discordância por terem sido condenados, solidariamente, no pagamento ao demandante A.da quantia de cinco mil euros, a título de indemnização por danos não patrimoniais, de harmonia com o disposto nos artigos 483º e 496º do Código Civil, por força do disposto no artigo 71º do CPP.

81- O assistente fundamentou o pedido cível deduzido contra os arguidos:

- nas dores e incómodos;

- justificado sentimento de medo e intranquilidade;

- grande vexame, sendo as expressões proferidas em voz alta, em local frequentado pela vizinhança e por quem passava nas proximidades, onde o Assistente trabalhava;

- causando-lhe vergonha e atingindo-o gravemente na sua honra e consideração, ele que é pessoa séria, conhecida e considerada no local.

82- Quanto às dores e incómodos, resultou provado que estas não foram de grande monta ou intensidade, tudo não passando de um ligeiro mal estar, provocado por um simples empurrão, não tendo causado lesões, mas um simples mau estar que nem obrigou o assistente a fechar o estabelecimento nesse dia nem a recorrer aos serviços hospitalares.

83- Para mais, resultou provado que no dia a seguir já o assistente estava a trabalhar na pastelaria com toda a normalidade.

84- Relativamente ao suposto sentimento de medo e intranquilidade sentidos pelo assistente entendem os recorrentes que o assistente não sentiu qualquer medo nem intranquilidade e que continuou a viver o seu dia a dia normalmente até à altura em que entendeu por bem fechar o estabelecimento que explorava, decisão que foi só sua.

85- No que tange ao vexame sentido pelo assistente, não resultou provado que à data dos factos estivessem presentes no estabelecimento quaisquer clientes, antes sim que apenas lá se encontravam assistente, arguidos e dois familiares do assistente.

86- Não resultou provado que as expressões proferidas tivessem sido ouvidas por vizinhos ou transeuntes.

87- Não se provou que tivessem sido os arguidos a relatar o que se passou, pelo que se tais factos se tornaram motivo de conversa e com isso o assistente sentiu vexame essa responsabilidade terá de ser assacada a quem tratou de espalhar tal notícia. Não podendo, por falta de prova que só ao o o assistente pode ser imputada, os arguidos serem responsabilizados por tal facto.

88- Quanto à afirmação que o assistente ainda sofreu mais por ser pessoa conhecida, tal não corresponde à verdade.

89- Foi o próprio assistente que em sede de audiência de discussão e julgamento declarou que os arguidos eram pessoas conhecidas no Chinicato, por ali sempre terem vivido e feito a sua vida, enquanto ele não era dali e por isso ninguém o conhecia.

90- Tal facto resulta claramente das declarações do assistente e constam da prova gravada.

91- Consideram os demandados ora recorrentes, que o Mmo. Dr. Juiz "a quo" deveria ter considerado a prova que foi feita relativamente ao pedido cível e consequentemente deveria o mesmo ter sido julgado improcedente por não ter sido provado o nexo de causalidade, entre os danos alegadamente sofridos e as condutas dos arguidos, não se verificando reunidos os requisitos para a obrigação de indemnizar.

92- Se assim se não entender, sempre se dirá que o valor do mesmo é manifestamente exagerado atenta a fatualidade provada e as condições sócio-economicas dos demandados, tendo sido violado o estatuído no art 494º do CC.

93- Pelo que deverá o mesmo ser consideravelmente reduzido, para valores que se coadunem com a gravidade das condutas dos demandados e com os danos morais que o demandante alega ter sofrido.

94- Ao não tê-lo feito violou o Mmo. Dr. Juiz "a quo" o disposto nos artigos 483º e 496º do Código Civil, por força do disposto no artigo 71º do Código de Processo Penal.

O recurso foi admitido.

Na resposta, o MºPº pronunciou-se no sentido da parcial procedência do recurso, concluindo como segue:

1 - Pelo presente recurso pretendem os arguidos atacar a sentença que os condenou pela prática dos crimes de ofensa à integridade física simples, ameaça agravada, e injúria, previstos e punidos pelos arts. 143 no 1, 153 no 1e 155 no 1 al. a) e ainda 181 no 1, todos do Código Penal, e ainda a pagar, solidariamente, uma indeminização ao ofendido no valor de 5.000,00Euros.

2- No entender dos arguidos ora recorrente, a prova dos factos dados como provados assentou também em fotografias que não foram exibidas em audiência de julgamento, pelo que, nos termos do art. 355 e 356 no 9 do Código Processo Penal, tal prova é inadmissível como se verificou uma nulidade.

3 - Entendem igualmente os recorrentes que não foi feita prova do crime de ameaça agravada pelo qual o arguido Rui Reis foi condenado, tanto mais que as expressões que foram dirigidas ao assistente não são um anuncio de um mal futuro mas antes eminente, faltando assim um dos elementos do tipo legal em causa. Sem prejuízo de, na perspetiva do arguido Rui, não se poder considerar as expressões dadas como provadas suscetíveis de integrar o crime de ameaça agravada, na medida em que a ameaça com anuncio de morte genericamente formulado, sem concretização dos meios a utilizar, não enquadra o tipo legal agravado.

4- Também o recorrente Amândio nega que se tenha feita prova do crime de ameaça agravada de que foi condenado, pois tão pouco as expressões por ele proferidas vão nesse sentido, como violou a sentença recorrida o principio da igualdade ao tecer as considerações sobre o arguido, como se de um criminoso em potencia se tratasse.

5 - Os recorrentes vem ainda defender que o Mmº Juiz "à quo" não foi imparcial como violou o principio do contraditório ao não ter permitido, em sede de julgamento, que o mandatário dos recorrente perguntasse ao ofendido se o mesmo havia sentido medo do arguido Amândio, dizendo ainda que o ofendido já havia falado de mais.

6- Em face disto, os recorrentes sindicam as penas aplicadas, advogando ainda que o tribunal "a quo" não teve em consideração as condições pessoais dos arguidos, e bem assim a sua condenação no pedido civil por falta de prova do nexo de causalidade entre os factos pelos quais foram condenados com os alegados danos.

7 - Ora, como se sabe, o âmbito, extensão e limite do recurso é dado pelas conclusões extraídas pelo recorrente na sua motivação, devendo apenas ser conhecidas pelo tribunal de recurso as questões nelas levantadas.

8 - Nessa medida e considerando a prova produzida em audiência de julgamento e sentença recorrida, salvo melhor opinião, parece-nos que aos recorrentes assiste, ainda parcialmente, razão.

9 - Com efeito, e no que ao arguido Rui Reis diz respeito, contrariamente ao que alega, da prova produzida em audiência de julgamento resulta a prática dos factos de que vem acusado - ainda que não se tenha em consideração as fotografias juntas - pois apesar de o arguido ter negado os factos que lhe são imputados, o depoimento prestado pelo ofendido foi credível e confirmado pelas testemunhas da acusação.

10 - O que não significa que todos sejam suscetíveis de tutela penal e nos termos e extensão em que o foram.

11 - Na verdade assiste razão ao arguido quando defende que a expressão "vamos ali para um fazenda, que é hoje que eu te mato, desliga as camaras" se traduz num mal atual e não futuro, fazendo falecer um dos elementos objetivos do tipo.

12- Contudo já o mesmo não se poderá dizer das expressões "vou-te rebentar os cornos todos, vou rebentar contigo". Tais expressões nos termos e circunstancias em que foram dirigidas terão efetivamente de se entender como o anúncio de um mal futuro, consistindo o mesmo na prática de um facto ilícito típico e penalmente tutelado, nomeadamente na prática de um crime de ofensa à integridade física.

13 - Do que se conclui, salvo o devido respeito e melhor opinião que esta conduta do arguido é integradora de um crime de ameaça simples, previsto e punido pelo art. 153 no 1 do Código Penal.

14- Em face disso, necessariamente que a pena aplicada ao arguido se mostra desajustada.

16 - Do mesmo modo, consideramos que os factos praticados pelo arguido Amândio tão pouco consubstanciam o cometimento de crime de ameaça agravada, pois a expressão: "ou paras de chatear o meu filho ou vou-te dar a reforma mais cedo", não consiste a promessa de um mal futuro que consista em si mesmo na prática de crime, ainda que dita de forma intimidatória e no seio de uma discussão.

17 - Antecipar a reforma ou dar a reforma, por si só, não consubstancia a prática de um facto típico e ilícito, fazendo falecer o preenchimento de um dos elementos objetivos do tipo.

18 - Mas ainda que se assim não se entenda, sempre se dirá que prometer uma antecipação da reforma, não pode ser considerando como uma ameaça de morte, pois a reformar-se não é morrer. Gozar a reforma pressupõe vida e não morte, caindo aqui também a agravação.

19 - Em face disso e ainda que se entenda que o arguido praticou o crime de ameaça, também a pena se mostra desajustada no seu montante, considerando também o que ficou provado quanto as condições pessoais do arguido pois se é certo que as penas devam consistir num verdadeiro sacrifício para o arguido condenado, não é menos certo que deverão ser fixadas de modo a não colocar seriamente em risco o mínimos necessários para a sua subsistência.

20- Já no que se refere à arguida Bruna consideramos que a sentença recorrida fez uma correta apreciação da prova e aplicação do direito, como a pena de se mostra adequada e suficiente às necessidades de prevenção geral e especial e de punição.

21- Em relação ao pedido de indemnização cível, também aqui assiste parcialmente razão aos recorrentes, na medida em que do elenco dos factos provados não resulta factualidade que justifique a indeminização nos termos em que foi fixada, sendo certo que é o próprio ofendido que admite que nem se divorciou, nem fechou o estabelecimento comercial por causa dos arguidos, não tem medo do arguido Rui, como continua a frequentar o Chinicato, local onde tinha o seu estabelecimento comercial e onde ocorreram os factos.

22 - Porém, também não temos duvidas que o ofendido, com a conduta dos arguidos Rui e Bruna, foi lesado na sua saúde, honra, consideração e bom nome, o que necessariamente lhe causou mal estar que tem de ser compensado, embora em montante inferior ao que foi fixado na sentença recorrida, que salvo o devido respeito se mostra excessiva.

23 - Finalmente, deverá o recurso improceder na parte em que defende a falta de imparcialidade do Mmº Juiz " aquo" e violação do direito ao contraditório, pois não foram indicados, nem ocorreram factos através dos quais possamos de forma inequívoca e cabal colocar em causa a objetividade do julgador, sem prejuízo de a sua interpretação da prova, factos e do direito aos mesmos aplicado não coincidir com a dos arguidos.

24 - Do mesmo modo o direito ao contraditório foi salvaguardado.

25 - Em conclusão, o recurso apenas parcialmente deve proceder.

Nesta Relação, a Exmª Procuradora-geral Adjunta emitiu parecer no qual manifestou a sua inteira adesão aos fundamentos de facto e de direito apresentados na resposta do MºPº na 1ª instância.

Foi cumprido o disposto no no 2 do art. 417º C.P.P., sem que tivesse sido apresentada resposta.

Colhidos os vistos, foram os autos submetidos à conferência.

Cumpre decidir.

2.Fundamentação

Na sentença recorrida foram considerados como provados os seguintes factos:

1p. Cerca das 17.48 horas do dia 6.11.2010, os arguidos dirigiram-se à pastelaria "X", sita na Rua..., Chinicato, Lagos, e uma vez no seu interior, o arguido Amândio dirigiu-se a A., desferiu um murro no balcão e disse-lhe "ou paras de chatear meu filho ou vou-te dar a reforma mais cedo".

2p. Simultaneamente, a arguida Bruna bateu com a mão no balcão e disse ao Assistente "vens para aqui, não tens vergonha, vens roubar os clientes para dares jantares de Natal à tua filha, palhaço, pára de chatear o meu irmão".

3p. O Assistente reagiu, pedindo-lhes que abandonassem o estabelecimento, quando o arguido Rui contornou o balcão, colocou as mãos no peito do Assistente e empurrou-o contra a máquina registadora, causando-lhe dores no peito e nas costas.

4p. O arguido Rui foi, depois, separado do Assistente pela arguida Bruna e por um circunstante, e ao ser retirado do estabelecimento, virou-se e disse para aquele "vou-te rebentar os cornos todos, vou rebentar contigo".

5p. O arguido Rui agiu de molde a causar ao Assistente as provadas dores.

6p. Ao proferirem as provadas expressões, os arguidos Rui e Amândio fizeram-no com foros de seriedade, assustando A. e fazendo-o temer pela sua vida, pois actuaram querendo afectar, como afectaram, a sua tranquilidade,

7p. No dia anterior, 5 de Novembro de 2010, o arguido Rui disse ao Assistente "tenho raiva de ti" e ainda "tu trabalhas mas é roubando os clientes, és uma merda igual a mim, não vales nada, vou-te foder a vida toda, estás fodido comigo".

8p. No dia 6 de Novembro de 2010, antes dos factos provados em 1p, 2p, 3p e 4p, o arguido Rui disse ao Assistente "vamos ali para uma fazenda, que é hoje que eu te mato, desliga as câmaras".

9p. As expressões proferidas pela arguida Bruna causaram ao Assistente ofensa na sua honra e consideração.

10p. Os arguidos agiram de modo livre, deliberado e consciente, sabendo que as suas condutas são punidas por lei,

11p. O Assistente é pessoa dedicada ao trabalho e à família, e ressentiu-se das dores e das palavras que o ameaçavam de morte, bem como das palavras que lhe imputavam "roubar os clientes" e lhe chamavam "palhaço", no contexto em que foram ditas.

12p. Os factos provados em 1p, 2p, 3p e 4p foram proferidas no estabelecimento do Assistente, diante das pessoas que lá se encontravam.

13p. O arguido Rui reside com seu pai e denota dificuldade de autocontrole, bem como falta de motivação para uma inserção laboral activa.

14p. A arguida Bruna, inserida no mercado de trabalho, tem família própria, aufere mensalmente cerca de 600,00 euros, e os factos em causa constituem, na sua vida, um episódio isolado, e basicamente o mesmo se passa com o arguido Amândio, que se mostra morigerado e estranho a episódios, como os que se provaram, antes denotando, não obstante, aversão a tais comportamentos.

15p. O arguido Rui tem o seguinte passado criminal:

a) Proc no ---/97.3TALGS deste 1º Juízo - decisão de 26 de Junho de 2000 - condenação em pena de multa por crime de ofensa à integridade física praticado no dia 4 de Outubro de 1997.

b) Proc no ---/04.4PALGS do 2º Juízo de Lagos - decisão de 26 de Junho de 2004 - condenação em pena de multa por crime de condução sem habilitação legal praticado no dia 25 de Junho de 2004.

c) Proc no ---/03.8PALGS deste 1º Juízo - decisão de 28 de Junho de 2004 - condenação em pena de multa por crime de condução sem habilitação legal praticado no dia 3 de Agosto de 2003.

d) Proc no ---/05.9GALGS do 2º Juízo de Lagos - decisão de 31 de Maio de 2005 - condenação em pena de prisão suspensa por crime de condução sem habilitação legal praticado no dia 4 de Maio de 2005.

e) Proc no ---/09.1GALGS do 2º Juízo de Lagos - decisão de 19 de Março de 2009 - condenação em pena de prisão suspensa por crime de condução sem habilitação legal praticado em Fevereiro de 2009.

16p. Os arguidos Amândio e Bruna são isentos de antecedentes criminais.

Excluídos considerações gerais e factos implicitamente decorrentes de outros, e já explicitamente provados ou não provados na sede própria, considerou-se como não provado:

1NP. Que os arguidos tenham formado um plano prévio.

2NP. Que o arguido Amândio tenha dito ao Assistente "já te disse, ou páras, ou vais ter um fim desgraçado".

3NP. Que a arguida Bruna tenha dito ao Assistente "ou páras de chatear o meu irmão ou estás fodido, porque ele tem família", sem prejuízo do provado em 2p.

4NP. Que no dia 5 de Novembro de 2011, pelas 9.00 horas, o arguido Rui tenha dito ao Assistente "vai à GNR, vai ao Tribunal, gasta o teu dinheiro todo, que eu a seguir parto-te os cornos todos, rebento contigo, fodo-te, cabrão de merda".

5NP. Que na mesma data, quando o Assistente se encaminhava para o seu estabelecimento, o arguido Rui lhe tenha dito "vou-te foder todo, cabrão de merda, quando te apanhar aí fora, rebento-te os miolos, deixa estar que eu vou-te apanhar lá fora, filho da puta".

A motivação da decisão de facto foi explicada como segue:

1 - O arguido Rui negou os factos; declarou que foi simplesmente ao estabelecimento no dia 6 de Novembro de 2011 buscar seu pai e sua irmã.

2 - Os arguidos Bruna e Amândio negaram também os factos que lhes são atribuídos.

3 - O Assistente disse tudo de quanto guardava recordação, de modo desassombrado, sem contradições, no que deixou de referir factos de ambas as acusações, mas prestando declarações escorreitas e que não merecem qualquer dúvida, dando pleno fundamento aos factos agora provados; o Assistente disse ainda que o clima criado lhe tirou clientes, e acresceu a outros factores, que tiveram o seu desfecho com o seu divórcio e o encerramento do estabelecimento em questão; salientou, porém, referindo-se a si e à sua família, "andávamos todos com medo".

4 - A testemunha BM, presente no local, presenciou a cena passada dentro do estabelecimento, e confirmou, com a sua narrativa, basicamente aquilo que o Assistente referiu, confirmando que o arguido Rui gritava que matava o Assistente, e que a testemunha, com o auxílio da arguida Bruna, conseguiu conduzir o arguido Rui ao exterior.

5 - A testemunha MM prestou declarações no mesmo sentido da testemunha BM, confirmando basicamente o que foi dito pelo Assistente; perguntada, declarou que o estabelecimento não fechou nos dias seguintes.

6 - As testemunhas AS, JI e AF depuseram em favor dos arguidos, a quem consideram boas pessoas, avessas a criarem desordem.

7 - A prova assenta ainda nas fotografias de folhas 126 e seguintes, nos relatórios sociais de folhas 371, 376 e 384, e nos certificados do registo criminal de folhas 309, 310 e 349.

3. O Direito

O âmbito do recurso é delimitado pelas conclusões extraídas pelo recorrente da respectiva motivação, sendo apenas as questões aí sumariadas as que o tribunal de recurso tem de apreciar (1) , sem prejuízo das de conhecimento oficioso, designadamente os vícios indicados no art. 410º no 2 do C.P.P. (2) .

No caso dos autos, face às conclusões da motivação do recurso, as questões essenciais que importa decidir são as seguintes:

- nulidade da sentença por valoração de prova proibida;

- erro de julgamento quanto aos pontos 3p, 4p, 5p, 6p e 8p;

- errada qualificação jurídica no tocante aos crimes de ameaça;

- violação dos princípios do contraditório e da imparcialidade;

- medida da pena;

- preenchimento dos requisitos da obrigação de indemnizar e montante da indemnização.

Porque se configura como prévia às demais enunciadas, vamos começar por apreciar a questão referida em quarto lugar.

3.1. Os recorrentes consideram que, durante a audição do assistente, quando o mandatário deles pretendeu questioná-lo a respeito dos receios do mesmo perante as ameaças de que se queixou, a fim de perceber de que forma os mesmos afectaram a sua tranquilidade, a instância foi interrompida pelo juiz que presidiu ao julgamento que, ao não permitir as perguntas, coarctou o direito ao contraditório, assumindo uma posição de parcialidade.

Estando em causa as declarações do assistente, a sua tomada durante a audiência de julgamento rege-se de acordo com a disciplina estatuída no art. 346º do C.P.P., de cujo no 1 decorre que, tratando-se de julgamento com tribunal singular, as perguntas são formuladas pelo juiz que preside ao acto, mesmo no caso em que o forem "a solicitação do Ministério Público, do defensor ou dos advogados das partes civis ou do assistente", cabendo-lhe filtrar as que considere como relevantes para a descoberta da verdade e boa decisão da causa.

A ter-se registado alguma divergência relativamente ao que os recorrentes pretendiam que fosse perguntado ao assistente e a recusa em formular a(s) pergunta(s) correspondentes, aqueles, persistindo no entendimento de que as perguntas em causa se revestiam de interesse para o objecto do processo, podiam ter lançado mão de dois meios de reacção: ou lavravam protesto na acta, valendo o mesmo como arguição de nulidade, em conformidade com o estatuído no E.O.A. (anterior art. 75º, actualmente art. 80º da Lei no 145/2015 de 9/8) ou, considerando haver razões para desconfiar da imparcialidade do juiz, suscitavam o competente incidente de recusa (art. 43º ss do C.P.P.).

Ora, compulsada a acta de julgamento, a fls. 402-404, verifica-se que os recorrentes nada disto fizeram, conformando-se com a decisão do Sr. Juiz de não formular as perguntas que pretendiam fossem feitas ao assistente.

Nessa medida, não podem pretender sindicar agora, nesta fase, uma pretensa parcialidade contra a qual não reagiram no momento próprio. E, quanto à pertinência das perguntas omitidas, só poderia ser sindicada caso tivesse havido algum défice de investigação que fosse recondutível ao vício prevenido na al. a) do no 2 do art. 410º do C.P.P., o que não é, de todo o caso, já que, feito o respectivo despiste no texto da decisão recorrida, onde os vícios da decisão hão-de evidenciar-se de forma ostensiva, não se detecta, mostrando-se os factos apurados bastantes para a prolação da decisão de direito.

3.2. Os recorrentes argúem a nulidade da sentença, fazendo decorrer este vício do facto de a convicção formada pelo tribunal recorrido ter assente, nomeadamente, nas fotografias a fls. 126 ss, sustentando que a valoração deste meio de prova ser legalmente proibido em face do estabelecido nos arts. 355º e 356º do C.P.P., por não ter sido objecto de apreciação e alvo de contraditório durante o julgamento e não lhes ter sido notificado. Em decorrência e por força do disposto no no 1 do art. 122º do C.P.P., pretendem que a sentença seja declarada nula e, em consequência, anulado o julgamento e determinado o reenvio do processo nos termos do art. 426º do C.P.P.

Muito embora o no 1 do art. 355º do C.P.P. estabeleça que "não valem em julgamento, nomeadamente para efeito de formação da convicção do tribunal, quaisquer provas que não tiverem sido produzidas ou examinadas em audiência", o no 2 do mesmo preceito excepciona "as provas contidas em actos processuais cuja leitura em audiência seja permitida, nos termos dos artigos seguintes".

Assim, de acordo com o preceituado nestas normas, a regra é a de que as provas que podem ser objecto de valoração pelo tribunal são aquelas que forem produzidas na audiência de julgamento e aquelas que, embora produzidas noutro contexto, hajam nela sido examinadas. Desta forma se garante uma maior proximidade com a prova e a possibilidade de pleno exercício do contraditório. No entanto, a lei não faz depender a possibilidade de valoração de todas as provas não produzidas na audiência do seu efectivo exame durante esta, admitindo que aquelas que estejam documentadas nos autos (aos quais os sujeitos processuais têm acesso, podendo aperceber-se da relevância probatória das mesmas, infirmá-las e contraditá-las), ainda que não sejam alvo de exame naquele momento processual, possam ser objecto de valoração. Ponto é que a leitura dos actos processuais onde se contêm não esteja abrangida pelas proibições que resultam dos arts. 356º e 357º do C.P.P. Parece-nos ser esta a melhor leitura que resulta da interpretação conjugada dos no 1 e 2 do preceito em referência e é também neste sentido que se vem inclinando a jurisprudência dos nossos tribunais superiores, na sequência do entendimento expresso por Maia Gonçalves (3) . Além de que, chamado a pronunciar-se, já o Tribunal Constitucional sufragou este entendimento (4) , não considerando inconstitucionais os normativos do art. 355º em análise, interpretados no sentido de que os documentos juntos aos autos não são de leitura obrigatória na audiência de julgamento, considerando-se nesta produzidos e examinados, desde que se trate de caso em que a sua leitura não seja proibida.

Das considerações acabadas de fazer resulta ser irrelevante que os documentos que neste caso foram valorados e serviram para sustentar a convicção formada pelo tribunal recorrido tenham ou não sido objecto de exame durante a audiência. Como a consulta dos autos evidencia, os fotogramas em causa (e os suportes dos quais foram retirados) foram juntas aos autos ainda no decurso do inquérito e foram expressamente indicados na acusação pública (cfr. fls. 270) como prova documental.

Assim, encontrando-se nos autos e tendo sido mencionadas em peça processual que foi notificada aos arguidos, mal se compreende que estes agora se queixem de que não foram notificados dessa prova. Se não sabiam da sua existência, sibi imputet, pois estava plenamente acessível a todos os sujeitos processuais que, por isso, tiveram ampla oportunidade de provocar tal exame, contraditá-la ou confirmá-la e oferecer prova num ou noutro sentido. Por isso, e porque tais fotogramas não contêm, obviamente, quaisquer declarações, não existia qualquer obstáculo legal à sua valoração.

Donde que, sem que se justifiquem mais alongadas considerações, se conclua pela não verificação da arguida nulidade e consequente improcedência deste fundamento do recurso.

3.3. Os recorrentes discordam da decisão da matéria de facto, apontando como incorrectamente julgados os pontos 3p, 4p, 5p, 6p e 8p dos factos provados por, em seu entender, a matéria neles vertida se encontrar em clara contradição com a prova gravada, em concreto, com as declarações do assistente, das quais resulta que o clima de receios em que ele e os seus familiares viviam não se devia aos acontecimentos ocorridos entre ele e os recorrentes mas sim a actos de vandalismo exercidos sobre a pastelaria que então explorava e viaturas que lhe pertenciam a ele e a familiares seus e cuja autoria não foi possível apurar.

Tendo o recorrente atacado a decisão da matéria de facto pela via da impugnação ampla e observado satisfatoriamente os ónus da especificação aludidos nos nos 3 e 4 do art. 412º do C.P.P., vamos proceder à análise das objecções que apresentou, tendo como traves mestres da nossa apreciação os limites a que o tribunal de recurso, que não beneficia da imediação e da oralidade como o tribunal de julgamento, está sujeito na medida em que o recurso é um remédio jurídico e que, por isso, "o Tribunal de segunda jurisdição não vai à procura de uma nova convicção, mas à procura de saber se a convicção expressa pelo Tribunal "a quo" tem suporte razoável naquilo que a gravação da prova pode exibir perante si" (5) , que "o recurso da matéria de facto não visa a prolação de uma segunda decisão de facto, antes e tão só a sindicação da já proferida, e o tribunal de recurso em matéria de exame crítico das provas apenas está obrigado a verificar se o tribunal recorrido valorou e apreciou correctamente as provas". (6) , e, enfim, que a reponderação de facto não é ilimitada, antes se circunscreve à apreciação das discordâncias concretizadas pelo recorrente "já que a Relação não fará um segundo/novo julgamento, pois o duplo grau de jurisdição em matéria de facto não visa a repetição do julgamento em 2.ª instância; a actividade da Relação cingir-se-á a uma intervenção cirúrgica, no sentido de restrita à indagação, ponto por ponto, da existência ou não dos concretos erros de julgamento de facto apontados pelo recorrente, procedendo à sua correcção se for caso disso, e apenas na medida do que resultar do filtro da documentação." (7)

Aqui chegados, e ouvida que foi a gravação da prova que os recorrentes invocam e aquela que o tribunal recorrido considerou como relevante para a formação da convicção no que tange à factualidade respeitante aos ilícitos criminais em causa, em concreto, as declarações do assistente e os depoimentos das testemunhas BM e MM, é forçoso concluir que a convicção formada pelo tribunal recorrido relativamente à ocorrência dos factos, tal como ficaram descritos nos pontos 3p, 4p, 5p e 8p, tem, não obstante a negação dos recorrentes, adequado suporte probatório naquelas declarações e também, quanto ao sucedido no interior do estabelecimento, naqueles depoimentos, não se vislumbrando qualquer fundamento para que pudéssemos concluir que a prova impunha decisão diversa.

A única questão subsistente reside em saber se, com as expressões que os recorrentes Rui e Amândio lhe dirigiram, o assistente sentiu, efectivamente, receio e intranquilidade (8) . Ora, das declarações prestadas pelo assistente não resulta claro que ele tenha sentido intranquilidade e receio devido às concretas expressões que lhe foram dirigidas pelos referidos recorrentes. De facto, o assistente relatou uma série de ocorrências anteriores, contemporâneas e posteriores às datas dos factos, em concreto diversos actos de vandalismo, que foram perpetrados por pessoas cuja identidade não foi possível apurar, sobre o estabelecimento de café que explorava e sobre viaturas sua pertença e de familiares seus, ocorrências essas que criaram um clima de grande instabilidade e de medo no seio do seu agregado familiar e levaram à perda de clientela, culminando com o fecho do estabelecimento e contribuindo para o divórcio do casal. Já quanto ao efeito concreto das ameaças, o recorrente afirmou que não tinha medo nenhum do recorrente Rui, que se sabe defender e que, por causa do sucedido, não alterou as suas rotinas diárias. Conferida a motivação da decisão de facto, não encontramos qualquer explicação para que, não obstante o teor dessas declarações, o tribunal recorrido se tenha convencido de que o recorrente, por causa das concretas ameaças, tenha temido pela sua vida e se tenha sentido assustado e intranquilizado. É já em sede de enquadramento jurídico, portanto deslocalizada do local próprio onde a explicação devia ser fornecida, que o tribunal recorrido tece as seguintes considerações:

4 - a - Sobre o crime de ameaça, cumpre observar que, no fim das suas declarações, o Assistente disse as palavras "não tenho medo dele", referindo-se ao arguido Rui.

b - O crime de ameaça não deixa de existir porque o ameaçado "não tem medo" do autor da ameaça, pois esse é o domínio do puro confronto pessoal.

c - Na realidade, ao explicar que veio a fechar o estabelecimento, e ao proferir a expressão "andávamos todos com medo", nela abrangendo a sua família, o Assistente confirmou o essencial do crime de ameaça, que é provocar "medo ou inquietação", não no contexto do confronto directo e, por assim dizer, "de mãos nuas", em que o Assistente nega ter medo do arguido Rui, mas no contexto de que a séria promessa de matar não tem qualquer relação com esse tipo de confronto.

Considerando-a embora, certo é que esta explicação não cobre totalmente a factualidade em apreciação tendo em conta que os receios e clima de inquietação sentidos pelo assistente e pelos seus familiares tinham, clara e assumidamente, outra causa subjacente. Admitindo que o assistente não tenha querido "dar parte de fraco" em tribunal, na presença dos recorrentes e em particular do Rui, apenas se pode retirar das suas declarações em conjugação com as regras da experiência comum que as ameaças, no concreto contexto que vivenciava quando lhe foram dirigidas, lhe causaram (ou, mais precisamente, contribuíram para lhe causar) inquietação, sabendo obviamente os recorrentes que as proferiram da respectiva aptidão para, pelo menos, gerar esse sentimento e também o receio de que pudessem vir a ser concretizadas.

Razões pelas quais consideramos existir fundamento para proceder à alteração do ponto 6p, de molde a que este passe a ter a seguinte redacção:

Ao proferirem as provadas expressões, os arguidos Rui e Amândio fizeram-no com foros de seriedade, sabendo que as mesmas eram adequadas a fazer o assistente sentir medo e inquietação, o que pretendiam, logrando dessa forma fazê-lo sentir-se inquieto.

Em decorrência, passará para os factos não provados que, ao proferirem as expressões em causa, os recorrentes tenho feito com que o assistente temesse pela sua vida.

Nessa estrita medida se acolhendo a pretensão recursiva apreciada.

3.4. Os recorrentes Rui e Amândio discordam, ainda, da qualificação jurídica dos factos.

Quanto ao recorrente Rui, sustenta que os factos por ele praticados não preenchem todos os elementos objectivos do crime de ameaça na medida em que as expressões por ele dirigidas ao assistente ("Vamos ali para uma fazenda, que é hoje que eu te mato, desliga as câmaras.", "vou-te rebentar os cornos todos, vou rebentar contigo") não traduzem um mal futuro mas sim um mal iminente.

Ambos os recorrentes sustentam, ainda, que a ameaça com um anúncio de morte quando não tenham sido concretizados os meios a empregar, como no caso sucedeu, cabe apenas na previsão do no 1 do art. 153º do C. Penal.

O tipo legal do crime de ameaça, que tutela a liberdade de decisão e de acção, tem como elementos constitutivos o anúncio de que o agente pretende infligir a outrem um mal que constitui crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor, a adequação da ameaça a provocar ao visado medo ou inquietação ou a prejudicar a sua liberdade de determinação, e o dolo genérico, em qualquer das suas modalidades.

Com a reconfiguração do tipo legal operada pela reforma de 1995, o crime de ameaça deixou de ser um crime de resultado, passando a crime de perigo, não se exigindo, portanto, que a ameaça provoque efectivamente medo ou inquietação no ofendido ou prejudique a sua liberdade de determinação, bastando ao preenchimento do tipo objectivo a adequação em concreto da ameaça para afectar a liberdade de decisão e acção, ainda que tal afectação (ou o perigo de afectação) não venham a ocorrer.

Independentemente, também, de o agente ter ou não o propósito de cumprir a ameaça.

"São três as características essenciais do conceito de ameaça: mal, futuro, cuja ocorrência dependa da vontade do agente: O mal tanto pode ser de natureza pessoal (...) como patrimonial (...). O mal ameaçado tem de ser futuro. Isto significa apenas que o mal, objecto da ameaça, não pode ser iminente, pois que, neste caso, estar-se-á diante de uma tentativa de execução do respectivo acto violento, isto é, do respectivo mal. (...) Necessário é só (...) que não haja iminência de execução, no sentido em que esta expressão é tomada para efeitos da tentativa (cf. Art. 22º-2 c)). Indispensável é, em terceiro lugar, que a ocorrência do "mal futuro" dependa (ou apareça como dependente (...) da vontade do agente). Esta característica estabelece a distinção entre a ameaça e o simples aviso da advertência. (...)" (9)

O pomo da discórdia reside, precisamente, na interpretação que se faz da destrinça entre o que se considera como mal futuro e como mal iminente. Enquanto que uns consideram que, quando o anúncio é de um mal iminente, não há crime de ameaça (10) , outros entendem que o mal iminente, embora esteja próximo, é ainda um mal futuro e a pedra-de-toque para distinguir o que é ameaça e o que são actos de execução de outro ilícito criminal que o agente tenha decidido cometer (11) (art. 22º no 1 do C. Penal) estará na intenção que presidiu à conduta em questão (12) .

O entendimento que perfilhamos quanto a esta questão é aquele que também foi seguido no Ac. RE 17/3/15 (13) , explanado no trecho que dele retirámos e de seguida vamos transcrever (sendo nossos os sublinhados):

Independentemente de questões de pormenor, parece-nos que o ponto essencial para a compreensão do tipo de ameaça reside na consideração de que a exigência do caráter futuro do mal prometido tem subjacente a ideia, pressuposta pelo legislador, de que o desvalor da ameaça já estará contido na efetiva incriminação pelo crime prometido, entendimento que nos parece igualmente presente no citado acórdão da RL de 09-03.2010 (14) , ao afirmar-se aí que a não punição da mera ameaça com mal iminente resulta de a conduta unitária onde aquela se insere integrar a prática de crime mais grave.

Para efeitos do preenchimento do tipo legal previsto no art. 153º do C. Penal a ameaça com a prática de um dos crimes de referência do artigo 153º não é típica se ocorrer em simultâneo com a sua execução, sob a forma tentada ou consumada, ou se a execução do crime prometido ainda não se iniciou mas está iminente, pois em ambas as situações, ou seja, quando se verifique identidade do crime prometido com o crime concretamente executado, o desvalor inerente à ameaça é desconsiderado pelo legislador por estar abrangido pela incriminação do crime prometido.

Isto é, a execução iminente do crime prometido não se distingue da efetiva execução do mesmo, a título tentado ou consumado, para efeitos da exclusão da tipicidade da ameaça a que se reporta o art. 153º do C.Penal, merecendo o mesmo tratamento jurídico-penal.

Na verdade, apesar de ser autonomizável o desvalor contido na ameaça com a prática de um crime cuja execução se lhe segue de imediato - pois a experiência mostra que em muitos casos (vg aquando da inflição de ofensas à integridade física que se prolongam no tempo) a potencialidade da ameaça para provocar medo ou inquietação (grosso modo) não deixa de verificar-se enquanto dura a execução respetiva ou no curto período de tempo que medeie entre a ameaça e a sua concretização -, o legislador pressupõe já a punição por aquele mesmo desvalor na punição do crime cometido, como referido.

Isto é, se bem vemos a questão, a desconsideração do desvalor da ameaça pressuposta pelo legislador só se verifica nos casos em que a ameaça é seguida ou acompanhada da execução do crime prometido ou por ele consumido - e não outro - , tanto na forma consumada como tentada, ou seja, quando se verifique identidade do crime prometido com o crime concretamente executado.

Significa isto, que o critério determinante para aferição da incriminação autónoma da "ameaça" é que da conduta global do agente praticada em dado momento resulte que o desvalor contido na ameaça não se esgota no desvalor do ilícito típico executado na mesma ocasião, aferida esta pelo critério da unidade de sentido do acontecimento ilícito-global adiantado e explicado pelo Prof. F.Dias (vd, Direito Penal, parte Geral, Tomo I, 2ª ed., 2007, especialmente o § 18 do cap. 43º a pp. 1016 e sgs.). Isto é, o desvalor da ameaça estará contido na punição do crime prometido quando, por se verificar aquela mesma punição, façam parte de um mesmo acontecimento ilícito-global.

2.3.4. A ser assim, como nos parece ser, daí resultam dois importantes corolários (...).

Por um lado, nas hipóteses em que a ameaça não se esgota no acontecimento ilícito-global em que se insere, projetando-se para além dele, quer por reportar-se a momento futuro, quer por referir-se a crime diferente não consumido pelo crime praticado, a ameaça não deixa de ser típica.

Por outro lado, a punição pela ameaça não é excluída (desde que preenchidos os demais elementos de ordem objetiva e subjetiva, naturalmente), pela simples circunstância de ser proferida num contexto de execução iminente do crime prometido ou de crime por ele consumido -, ou seja, quando, objetiva e subjetivamente, o agente promete a prática de um dos crimes de referência reportando-se ao momento imediato ou presente e não a uma hipotética situação futura -, desde que a execução deste crime não chegue a ter lugar ou se a mesma execução não for punível, como sucede no caso de tentativa não punível de crime contra a integridade física.

Do mesmo modo, a ameaça com mal iminente, naquele mesmo sentido, não deixa de ser típica se naquele momento o agente pratica um outro crime (quer preencha o mesmo ou diferente tipo legal), tentado ou consumado, e não o crime prometido, como sucede no caso presente em que o arguido prometia a prática (imediata, como melhor veremos) de crime contra a vida enquanto executava crime contra a integridade física.

Daí que não possa dizer-se, sem mais, que a ameaça só é típica quando tenha por objeto um mal futuro, pois mesmo quando o mal prometido se apresenta como iminente , isto é, com o sentido de que o agente pretende executar imediatamente o crime objeto da ameaça, o desvalor inerente à potencial provocação de medo ou inquietação na vítima mantém-se intacto se o agente não iniciar ou continuar a execução daquele crime mas de um outro que não consuma aquele, como referido. Consumi-lo-á, por exemplo, se o agente profere ameaça contra a integridade física mas acaba por cometer homicídio, não sendo punível a ameaça.

Em ambas as hipóteses, porque a ameaça (enquanto elemento objetivo do tipo) não se integra com o crime prometido num mesmo acontecimento ilícito-global, mantém-se a autonomia do desvalor da ameaça e a consequente necessidade de tutela penal.

No que concerne à pretensa necessidade de concretização dos meios a empregar quando a ameaça contenha um anúncio de morte, a questão, suscitada pelo acórdão que os recorrentes invocam (15) , de "saber se a agravação do crime de ameaça prevista no artigo 155º, n.o 1, alínea a), se verifica quando o crime objecto da ameaça (obviamente um dos previstos no n.o 1 do artigo 153º), é punível com pena de prisão superior a três anos ou, ao invés, quando a ameaça (obviamente de um dos crimes previstos no n.o 1 do artigo 153º) é feita mediante o anúncio da utilização de meios que constituem crime punível com pena de prisão superior a três anos", foi decidida em sentido negativo pelo AUJ no 7/2013 (16) , que fixou jurisprudência no sentido de que «A ameaça de prática de qualquer um dos crimes previstos no n.o 1 do artigo 153º do Código Penal, quando punível com pena de prisão superior a três anos, integra o crime de ameaça agravado da alínea a) do n.o 1 do artigo 155º do mesmo diploma legal».

Tendo presentes todas estas considerações, podemos afoitamente concluir que a conduta do recorrente Rui, tal como se encontra descrita nos pontos 7p (quanto ao dia 5/11/10, em que disse ao assistente, nomeadamente, "vou-te foder a vida toda, estás fodido comigo"), e 8p e 4p (quanto ao dia 6/11/10, em que, antes de ter entrado na pastelaria do assistente, lhe disse "vamos ali para uma fazenda, que é hoje que eu te mato, desliga as câmaras" (17) e, já depois de ali ter entrado e de o ter empurrado contra a máquina registadora, quando estava a ser retirado do local, ainda lhe disse "vou-te rebentar os cornos todos, vou rebentar contigo"), unificada - pela proximidade temporal e de contexto, que permitem concluir pela existência de uma única resolução criminosa - num único crime de ameaça, agravada, preenche inequivocamente todos os elementos do correspondente tipo legal, traduzindo-se as expressões em causa, na sua leitura integrada, num claro anúncio de morte.

A questão assume contornos muito distintos no que respeita à expressão proferida pelo recorrente Amândio. Desde logo, a promessa de "dar a reforma mais cedo", não consubstancia um anúncio de morte, porque sendo a reforma a situação de um trabalhador que tem isenção definitiva da efectividade do serviço, por incapacidade física ou por ter atingido determinada idade legal, e que recebe determinada pensão ou remuneração, obviamente que a mesma não é compatível com a morte. Além disso exigindo o tipo objectivo que o mal ameaçado configure, em si mesmo, um facto ilícito e típico ("Quem ameaçar outra pessoa com a prática de crime contra a vida, a integridade física, a liberdade pessoal, a liberdade e autodeterminação sexual ou bens patrimoniais de considerável valor (...)"), prometer uma antecipação da reforma, ainda que a expressão tenha sido proferida de forma intimidatória e no seio de uma discussão, e mesmo que seja adequada a causar inquietação e receio de que possa vir a ser concretizada, não consubstancia, em si mesma, a prática de um facto ilícito e típico (podendo conceber-se meios, mais ou menos censuráveis mas não necessariamente criminosos, de levar a que alguém não tenha condições para exercer a sua actividade profissional), fazendo falecer o preenchimento de um dos elementos do tipo do crime, como justamente observa o MºPº na resposta ao recurso.

Em decorrência, a apurada conduta do recorrente Amândio não é criminalmente punível, devendo ser revogada a decisão recorrida na parte em que o condena pela prática do crime de ameaça - e, necessariamente também na parte em que o condena no pagamento de indemnização ao assistente/demandante (18) - procedendo, apenas em relação a ele, este fundamento do recurso e ficando prejudicados os demais no que a este recorrente dizem respeito.

3.5. Os recorrentes insurgem-se contra a medida em que as penas foram fixadas, considerando-a excessiva e violadora do disposto no no 2 do art. 72º do C. Penal e apontando, no que concerne ao recorrente Rui, que não foram levadas em consideração as suas condições económicas nem as sugestões constantes do relatório social no sentido de que lhe seja aplicada uma medida não privativa da liberdade que não seja economicamente onerosa, e, quanto à recorrente Bruna, que não foi devidamente valorada a pequena gravidade da sua conduta. Considerando que o pagamento das multas em que foram condenados é praticamente impossível e que redunda no cumprimento de uma pena de prisão, defendem que as penas aplicadas deveriam ter sido fixadas mais próximo dos mínimos legais e que a taxa diária da multa não deveria ser superior ao mínimo legal de 5€.

As finalidades das penas vêm indicadas no no 1 do art. 40º do C. Penal: a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade. São, pois, finalidades relativas de prevenção, geral e especial, que justificam a intervenção do sistema penal e conferem fundamento e sentido às suas reacções específicas. A prevenção geral, enquanto prevenção positiva ou de integração, i. e. "como estabilização contrafáctica das expectativas comunitárias na validade e vigência da norma infringida", assume o primeiro lugar como finalidade da pena (19) .

Por outro lado, o princípio da culpa, acolhido no nosso ordenamento jurídico-penal e cujo fundamento axiológico radica no princípio da inviolabilidade da dignidade pessoal, implica que a culpa seja condição necessária da aplicação da pena e, simultaneamente, que a medida da pena não possa ultrapassar a medida da culpa (20) .

Estes princípios encontram expressão nos no 1 e 2 do art. 40º do C. Penal, nos termos dos quais as penas têm como finalidade a protecção de bens jurídicos e a reintegração do agente na sociedade, e não podem em caso algum ultrapassar a medida da culpa.

E, bem assim, no no 1 do art. 71º do C. Penal, de acordo com o qual a determinação da medida da pena, dentro dos limites definidos na lei, é feita em função da culpa do agente e das exigências de prevenção, operação na qual, e de acordo com o no 2 do mesmo preceito, o tribunal terá de atender àquelas circunstâncias que, não fazendo parte do tipo de crime, deponham a favor ou contra o agente.

O equilíbrio desejável entre as finalidades relativas à prevenção geral e à prevenção especial não obsta a que, perante as especificidades do caso concreto, uma dessas finalidades haja de prevalecer sobre a outra.

Nos casos em que a lei preveja, em alternativa, a aplicação de pena preventiva e não preventiva da liberdade, antes da determinação da medida concreta da pena haverá que proceder à escolha da pena seguindo o critério definido no art. 70º do C. Penal, ou seja, dar preferência à pena não privativa da liberdade sempre que ela realize de forma adequada e suficiente as finalidades da punição (indicadas no art. 40º, como já acima referimos).

Na sentença recorrida procedeu-se à escolha e determinação da medida concreta das penas nos seguintes moldes:

1 - a - Os arguidos agiram todos com dolo directo, porque quiseram efectivamente executar as condutas que se provaram.

b - Os arguidos Bruna e Amândio, porém, intervieram num contexto acidental, levados pela força dos laços de família, e querendo somente fazer causa comum com o seu irmão, e filho, Rui.

c - O arguido Rui agiu com um dolo mais intenso, já porque a sua conduta revela persistência num comportamento agressivo em relação ao Assistente, já porque se permitiu perder o autodomínio num contexto, cuja explicação não é clara, mas que não denuncia qualquer causa adequada a justificar agressões ou outros comportamentos agressivos para com o Assistente.

2 - O grau de ilicitude varia de arguido para arguido, pois mostra-se moderado quanto aos arguidos Bruna e Amândio, mas mais elevado quanto ao arguido Rui, que agrediu e proferiu palavras ominosas com plena convicção e em contexto injustificado.

3 - Os arguidos Bruna e Amândio não têm condenações anteriores, mas o arguido Rui exibe um passado criminal consentâneo com uma personalidade avessa ao cumprimento da lei, a ponto de sofrer penas de prisão, de execução suspensa embora, por persistência no comportamento de conduzir sem estar habilitado a fazê-lo.

4 - a - A negativa dos arguidos Bruna e Amândio, se não impediu a prova dos factos, impede, no entanto, que gozem da atenuante da confissão; a assunção das responsabilidades, sempre importante, não opera quanto a estes dois arguidos; mas provou-se que a arguida Bruna se esforçou, a certo ponto, por convencer o seu irmão, o arguido Rui, a pôr termo ao seu acesso de violência.

b - Já a negativa do arguido Rui, porém, conjugada com a desfavorável informação do relatório social, e ainda com o seu certificado do registo criminal, resulta num quadro extremamente inquietante.

c - Desmotivado em relação a trabalho, o arguido Rui beneficiará aqui da dúvida suscitada pela situação económica actual do País, com a taxa de desemprego a subir constantemente e o nível de investimento abaixo já do zero, que é o nível onde se localizam as oportunidades de que gozam os desempregados nesta época.

5 - A arguida Bruna acabou por limitar a sua conduta a dirigir palavras ofensivas ao Assistente, e ajudou a remover seu irmão Rui do estabelecimento do Assistente; tivesse a arguida assumido as suas responsabilidades, narrando os factos e aceitando aqueles que praticou, e proporcionaria agora ao Tribunal a possibilidade de fazer uso do artigo 60º do Código Penal.

6 - O arguido Amândio, ao prometer "uma reforma antecipada", profere uma clara e perigosa ameaça de morte, porventura mais de temer do que a de seu filho, pois é legítimo que o ameaçado espere dele o efectivo cumprimento do que promete, já porque só pode cumpri-lo furtivamente, mediante o uso de arma de fogo, já porque a sua idade lhe permite encarar com uma tranquilidade relativa o cumprimento duma pena de prisão por homicídio; estes dados, imanentes à condição pessoal deste arguido, tornam a sua ameaça a mais séria e mais temível das que se mostram nos autos.

7 - Em todo o caso, isentos de antecedentes criminais, e sem nada mais a assinalar, designadamente por parte do Assistente, pode dizer-se que os arguidos Bruna e Amândio não suscitam, a esta data, particulares preocupações no tocante a prevenção geral, se bem que, pelo que respeita a prevenção especial, não tenham querido exprimir qualquer tipo de censura pelo seu comportamento.

8 - a - O arguido Rui suscita outro tipo de inquietação, atento o que já se disse; não assumiu as suas responsabilidades e encontra-se no inquietante contexto já assinalado.

b - A falta de censura dos seus actos por este arguido, se deixa fortes reservas quanto a prevenção especial, nada augura de positivo quanto a prevenção geral, pois a sua comprovada tendência para a prática de actos puníveis com pena de prisão tem agora aqui de ser salientada.

9 - a - Assim, e conquanto sejam de pequena monta as consequências directas que, para a saúde do Assistente, veio a ter a agressão sofrida, importa agora considerar as condutas no contexto da sua punição concreta.

b - Pelo que respeita à arguida Bruna, a punição com pena de multa ajusta-se de per si, pois a sua conduta assumiu uma gravidade relativa, por assim dizer num coro de homens, a que juntou a sua voz de mulher.

c - Também ao arguido Amândio será imposta pena de multa, em medida mais gravosa todavia, mas ainda assim considerando a ausência de antecedentes criminais, a sua idade e o modo limitado como actuou.

10 - a - O arguido Rui, por tudo quanto já se disse, não pode já ser simplesmente condenado em pena de multa; o que se tem agora de determinar é qual o regime em que se lhe aplicará pena de prisão.

b - Foi o arguido já condenado em pena de prisão suspensa por duas vezes, uma em 2005, por factos de 2005, e outra em 2009, por factos de 2009; os factos aqui em apreço são de 2010, mas é certo que não constam outros, o que leva a concluir, em seu benefício, que mediou um ano entre a última condenação e a prática subsequente de novos crimes, mas passaram três anos desde estes últimos (os dos autos) e o presente julgamento, sem que o seu cadastro acuse outros incidentes.

c - A proximidade, todavia, entre a última condenação em pena de prisão, suspensa na sua execução, diz-nos que o arguido não se sentiu punido; como acontece na esmagadora maioria dos casos de aplicação deste instituto - a suspensão da execução da pena de prisão - os arguidos não o sentem como uma punição, pelo contrário, sentem-se exonerados, na verdade impunes; o caso vertente é um exemplo disso, pois a única ilação que o arguido extraiu de tal suspensão foi a de podia continuar a cometer crimes - e assim aconteceu, o arguido não se fez rogado.

Vejamos, pois.

11 - a - À arguida BR. será, na sequência do que ficou dito, imposta pena de noventa dias de multa à razão diária de 7,50 euros, no total de 675,00 euros.

b - Ao arguido AJ. será por sua vez, também na sequência do que ficou dito, imposta pena de cento e oitenta dias de multa à razão diária de 7,50 euros, no total de 1.350,00 euros.

12 - a - Ao arguido RM. serão impostas penas parcelares de prisão por cada um dos três provados crimes, fazendo-se no cúmulo jurídico, de harmonia com o artigo 77º do Código Penal, a determinação do regime do seu cumprimento.

b - Assim, quanto ao crime de injúria, vai o arguido punido com a pena parcelar de dois meses de prisão; quanto ao crime de ameaça, vai o arguido punido com a pena parcelar de seis meses de prisão; e quanto ao crime de ofensa à integridade física, vai o arguido punido com a pena parcelar de nove meses de prisão.

c - Em cúmulo jurídico, nos termos do artigo 77º do Código Penal, vai imposta ao arguido RM. a pena única de um ano de prisão, substituída por 365 dias de multa à razão diária de 7,50 euros, no total de 2.737,50 euros, em conformidade com o artigo 43º, no 1, do mesmo Código.

Circunscrita a nossa análise às penas aplicadas aos recorrentes Rui e Bruna, temos que os factos praticados por um e pelo outro preenchem a previsão típica dos crimes pelos quais foram condenados, qualquer deles punível, em alternativa com pena de prisão ou de multa.

No que respeita à recorrente Bruna e ao ilícito criminal por esta praticado (crime de injúria), a opção por pena não privativa da liberdade não foi posta em causa e encontra-se devidamente justificada, devendo em conformidade a pena concreta situar-se numa moldura abstracta de 10 a 120 dias de multa (arts. 181º no 1 e47º no 1 do C. Penal).

Quanto ao recorrente Rui, também se aceita como correcta a opção por pena privativa da liberdade, tendo em conta mormente as exigências de prevenção especial que ressumam dos seus antecedentes criminais (21) e dos factores de risco assinalados no relatório social a fls. 376-379 e resumidamente vertidos no ponto 13p dos factos provados. As penas parcelares concretas devem situar-se dentro das molduras abstractas de 1 mês a 3 anos (quanto ao crime de ofensa à integridade física), de 1 mês a 2 anos de prisão (quanto ao crime de ameaça agravada) e de 1 a 3 meses de prisão (quanto ao crime de injúria).

Aqui chegados e antes de conferirmos e as penas concretas se mostram desproporcionadas, como sustentam os recorrentes, cumpre frisar que, como é entendimento generalizado (22) , a intervenção correctiva do tribunal de recurso na medida da pena só colhe justificação quando se registem desvios aos princípios, operações e critérios que regem a sua dosimetria, não abrangendo a determinação, dentro daqueles parâmetros, do quantum exacto de pena que não se revele de todo desproporcionada.

Assim, e abordando em primeiro lugar a pena aplicada à recorrente Bruna, fixada em 90 dias numa moldura de 10 a 120 dias, a mesma mostra-se efectivamente excessivamente severa tendo em conta o conjunto de circunstâncias atenuantes que o tribunal recorrido no essencial até destacou (primariedade, intervenção num contexto acidental, levada pelos laços familiares que a ligam ao recorrente Rui, seu irmão, sendo insignificantes as exigências de prevenção especial, grau de ilicitude moderado, intervenção tendente a fazer terminar o conflito nos momentos posteriores à prática dos factos, inserção familiar e laboral), justificando-se a respectiva redução para 50 dias de multa.

Em relação às penas aplicadas ao recorrente Rui, e tendo em consideração todas as circunstâncias relevantes que o tribunal recorrido também identificou, não vislumbramos excessiva severidade no doseamento das penas parcelares, adequadas à concreta gravidade dos factos, satisfazendo as exigências de prevenção sem que ultrapassem a medida da culpa do recorrente. A pena única aplicada, achada dentro da moldura abstracta de 9 a 17 meses e fixada em 1 ano de prisão, também se coaduna com a apreciação global dos factos e a personalidade que, através deles, se evidencia. Aceita-se (23) , igualmente, a substituição da prisão por multa ao abrigo do disposto no no 1 do art. 43º do C. Penal.

Restará, então, conferir se as críticas que os recorrentes dirigem ao montante em que foi fixada a taxa diária têm fundamento.

De acordo com o disposto no no 2 do art. 47º do C. Penal, esta taxa é fixada, entre 5 e 500 €, "em função da situação económica e financeira do condenado e dos seus encargos pessoais".

Como é entendimento corrente, a taxa diária da multa deve ser fixada de forma a que mesma represente um sacrifício real para o condenado, para que mantenha a sua característica de verdadeira pena, pois de outro modo não será possível, através da sua aplicação, realizar as finalidades da punição.

Dos pontos 13p e 14p dos factos provados retira-se que ambos os recorrentes têm uma situação económica muito modesta: enquanto que o recorrente Rui não tem rendimentos próprios, residindo com o pai e a expensas deste, a recorrente Bruna aufere um rendimento que em pequena medida ultrapassa o S.M.N.

Consideramos assim, em face do (pouco) que se apurou no tocante à situação económica dos recorrentes, que se justifica a redução da taxa diária da multa para o mínimo legal de 5 €.

Refira-se, por último, que não assiste razão aos recorrentes quando afirmam que a condenação no pagamento de multas pesadas para a sua capacidade económica se traduz, na prática, no cumprimento de penas de prisão porque a lei prevê mecanismos para permitir o cumprimento das penas aos condenados que tenham dificuldades ou mesmo não possam proceder ao pagamento da multa.

3.6. Finalmente, os recorrentes discordam da condenação no pagamento de indemnização ao assistente/demandante, sustentando a sua pretensão absolutória na afirmada falta de preenchimento dos pressupostos legais, nomeadamente por ausência de prova quanto ao nexo de causalidade entre os danos considerados e as suas condutas. Subsidiariamente, defendem que o montante fixado é muito exagerado em face da factualidade provada e das suas condições socio-económicas, apontando como violado o disposto no art. 494º do C., Civil e pretendendo que aquele montante seja consideravelmente reduzido.

Refira-se, antes de mais, que no caso é admissível recurso autónomo da parte cível uma vez que preenchidos se mostram os requisitos cumulativos estabelecidos no no 2 do art. 400º do C.P.P. (que o valor do pedido seja superior à alçada do tribunal recorrido, como o era à data da dedução do mesmo, e que a decisão impugnada seja desfavorável para o recorrente em valor superior a metade daquela alçada).

No caso, o assistente deduziu pedido indemnizatório contra os 3 recorrentes, pedindo a sua condenação solidária no pagamento de 5.000€ por danos patrimoniais decorrentes das condutas por eles praticadas, nomeadamente dores, incómodos, medo e intranquilidade e vexame sofridos.

A obrigação de indemnizar depende do preenchimento de todos os pressupostos em que assenta a responsabilidade civil extracontratual, indicados no no 1 do art. 483º do C. Civil. (o facto voluntário do agente; a ilicitude do facto; o nexo de imputação do facto ao agente; o dano; e o nexo de causalidade entre o facto e o dano). Estando em causa danos não patrimoniais, são atendíveis na fixação da indemnização quando, pela sua gravidade, mereçam a tutela do direito, sendo o montante da indemnização fixado equitativamente pelo tribunal, tendo em atenção o grau de culpabilidade do agente, a situação económica deste e do lesado e as demais circunstâncias relevantes que no caso se verifiquem (nos 1 e 3 do art. 496º do C.Civil). Havendo uma pluralidade de pessoas responsáveis pelos danos, a sua responsabilidade é solidária, de acordo com o disposto no no 1 do art. 497º do C. Civil.

Na sentença recorrida, a fundamentação atinente ao pedido indemnizatório resumiu-se às escassas linhas a seguir transcritas:

Os factos invocados no pedido de indemnização provaram-se na medida necessária e suficiente, para se ter como adequada a quantia pedida, de harmonia com o disposto nos artigos 483º e 496º do Código Civil, por força do disposto no artigo 71º do Código de Processo Penal, pelo que os arguidos, como demandados, irão solidariamente condenados no seu pagamento ao Assistente, como demandante, sem juros, por não terem sido pedidos.

Ora, é inquestionável que, perante a factualidade agora considerada como definitivamente assente - e que, em decorrência do que acima se disse no que respeita ao recorrente Amândio, passou a circunscrever-se àquela que concerne apenas aos demais recorrentes, se mostram preenchidos, no caso, todos os pressupostos da responsabilidade civil, não podendo ser acolhida a pretensão absolutória dos recorrentes. De facto, o recorrente Rui ofendeu a integridade física do assistente/demandante, empurrando-o contra a máquina registadora, causando-lhe dessa forma dores no peito e nas costas, dirigiu-lhe expressões ameaçadoras (que o ia rebentar, que o ia matar, que lhe foder a vida) causando-lhe intranquilidade, bem como expressões ofensivas da sua honra e consideração (que trabalhava mas era a roubar os clientes, que era uma merda e que não valia nada), de que ele se ressentiu. E a recorrente Bruna dirigiu-lhe expressões ofensivas da honra e consideração (que vinha roubar os clientes para dar jantares de Natal à filha dele e chamando-o de palhaço), causando-lhe ofensa na sua honra e consideração.

No entanto, e não obstante a proximidade temporal e geográfica entre a conduta praticada pela recorrente Bruna e parte das praticadas pelo recorrente Rui, não se vislumbra, nem sequer foi indicado, fundamento para que tenha sido decretada a condenação solidária no pagamento da indemnização, na medida em que não consta da matéria de facto provada qualquer referência a uma actuação conjunta, implícita ou explicitamente pré-acordada entre eles - foi, até, considerada como não provada a existência de um plano prévio -, e também não foram os mesmos condenados no quadro da co-autoria. Assim, sendo possível discriminar os danos que cada uma das condutas dos recorrentes causou, devem eles ser condenados autonomamente, em indemnização destinada a compensar exclusivamente esses danos.

Entrando em sede de montante indemnizatório, também se apresenta como claramente excessivo, sem justificação expressa ou detectável desde logo em face da concreta gravidade dos danos e dos critérios que vêm sendo seguidos na prática jurisprudencial, aquele que foi arbitrado, aliás coincidente com o que o demandante havia peticionado.

Assim, reponderando os danos causados que, tal como se colhe da factualidade provada, não tiveram grande expressão, resumindo-se a dores causadas pelo empurrão, inquietação causada pelas ameaças, desgosto pelas injúrias, o grau de culpa de cada um dos recorrentes (dolo, intenso e reiterado quanto ao recorrente Rui e de menor intensidade quanto à recorrente Bruna, que momentos depois interveio para evitar que o conflito entre o irmão e o assistente se transformasse num confronto físico entre os dois) e o pouco que se apurou a respeito da situação económica dos envolvidos, consideramos adequada fixar em 1.500€ e em 300€ as indemnizações a pagar pelos recorrentes Rui e Bruna, respectivamente, valores para os quais serão reduzidas.

4. Decisão

Por todo o exposto, julgam parcialmente procedente o recurso e, em consequência:

a) alteram a decisão da matéria de facto nos moldes acima indicados;

b) revogam a sentença recorrida na parte em que condenou o arguido AJ. pela prática de um crime de ameaça agravado e em obrigação de indemnizar o assistente/demandante,, absolvendo-o da prática daquele crime e do pedido de indemnização:

c) reduzem a pena aplicada à arguida BR. pela prática de um crime de injúria para 50 (cinquenta) dias de multa;

d) reduzem para 5€ (cinco euros) a taxa diária das penas de multa aplicadas aos recorrentes RM. e BR, em resultado do que ficam condenados, o primeiro na pena única de 1 (um) ano de prisão, substituída por 365 dias de multa à taxa diária de 5€, e a segunda na pena de 50 dias de multa à taxa diária de 5 €;

e) revogam a sentença condenatória na parte em que condenou os recorrentes a pagar solidariamente ao assistente/demandante a indemnização arbitrada, condenando, antes, o recorrente RM. a pagar-lhe a quantia de 1.500 € (mil e quinhentos euros) e a recorrente BR.a de 300€ (trezentos euros);

mantendo em tudo o mais a sentença recorrida.

Sem tributação.

Évora, 7 de Junho de 2016

Maria Leonor Esteves

António João Latas

__________________________________________________

(1)

(cfr. Prof. Germano Marques da Silva, "Curso de Processo Penal" III, 2ª ed., pág. 335 e jurisprudência uniforme do STJ (cfr. Ac. STJ de 28.04.99, CJ/STJ, ano de 1999, p. 196 e jurisprudência ali citada).

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(2)

Ac. STJ para fixação de jurisprudência no 7/95, de 19/10/95, publicado no DR, série I-A de 28/12/95.

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(3)

cfr. anotações ao art. 355º, Código de Processo Penal, anotado e comentado, 12ª ed., págs. 667-668, onde vem citada diversa jurisprudência no mesmo sentido.

Para além dos arestos ali mencionados, cfr., entre outros, os Acs. STJ 23/2/05, C.J. STJ, ano XIII, t. 1, pág. 210 e 4/7/07, proc. no 07P2304.

Em sentido contrário, Germano Marques da Silva, Curso de Processo Penal, III, pág. 235-236.

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(4)

cfr. Ac. TC no 87/99, de 9/2/99.

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(5)

cfr. Ac. RC de 3/10/00, CJ., ano 2000, t. IV, pág. 28

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(6)

cfr. Ac STJ 7/6/06, proc. No 06P763.

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(7)

cfr. Ac. STJ 12/6/08, proc. no 07P4375 .

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(8)

Embora o tipo legal de crime não seja, actualmente, um crime de resultado, mantêm interesse o apuramento das consequências que a conduta do agente possa ter causado, nomeadamente para efeitos de graduação da pena e do montante da indemnização.

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(9)

cfr. Comentário Conimbricense do Código Penal, t. I, pág. 343

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(10)

cfr. Acs. RP 25/9/02, proc.º 0240259, 22/1/03, proc.º 0210754, 17/11/04, proc.º n.o 0414654, 23/2/05, proc.º 0510031, 30/3/05, proc.º 0510587, 25/1/06, proc.º n.o 0544124, 17/5/06, proc.º n.o 0411428, 22/11/06, proc.º n.o 0614091, 20/12/06, proc.º n.o 0645320, 28/11/07, proc.º n.o 0712156, 28/5/08, proc.º n.o 0841544, 22/6/11, proc no 41/10.0GAVMS.P1 e 7/3/12, proc no 625/10.6GBVNG.P1, RG 1/2/10, proc. no 495/05.6GBMR.G2 e RC 7/3/12, proc. no 110/09.9TATCS.C1 e 30/5/12, proc. no 366/10.4GCTND.C1.

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(11)

Casos claros em que não há ameaça, mas sim tentativa da prática de outro crime são os que foram analisados nos Acs. RP 28/5/03, proc.º 0340713, RL 11/12/03, proc. no 7569/2003-9 e 3/11/09, proc. no 1092/02.3PBOER.L1-5, e RE 4/11/10, proc. no 13/07.1GLBJA.E1.

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(12)

Na órbita deste entendimento, cfr. Acs. RP 16/2/00, proc.º n.o 9910861, 7/1/08, proc. no 1798/07-2 e 13/7/11, proc no 416/10.4TAOAZ.P1 (este com a nuance de considerar que o critério distintivo se dever ir buscar a razões teleológicas ligadas à especificidade dos bens jurídicos tutelados pelas normas em equação, podendo o tradicionalmente usado, da temporalidade, funcionar como adjuvante), RG 18/5/09, proc. no 349/07.1PBVCT, RC 9/9/09, proc. no 363/08.0OGAACB.1 e 23/9/09, proc. no 541/04.0GBPBL.C1, RL 11/2/10, proc. no 105/08.0PCPDL.L1-9 e 9/3/10, proc no 1713/06.9TALRS.L1.5, e RE 6/9/11, proc no 428/09.0PBELV.E1.

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(13)

Proc. no 1857/11.5PCSTB.E1, relatado pelo colega que ora intervém como adjunto.

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(14)

Proc. no 1713/06.9TALRS.L1-5.

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(15)

Ac. RP 25/3/10, proc. no 2940/08.0TAVNG.P1

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(16)

D.R., S. I, 20/3/13

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(17)

Sendo irrelevante para o preenchimento do crime que o assistente tenha entendido esta expressão como tratando-se de um desafio, que ela de facto contém, porque a mesma é indubitavelmente adequada a provocar medo e inquietação.

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(18)

Tendo o assento no 7/99, D.R., I-A de 3/8/99, fixado jurisprudência no sentido de que «Se em processo penal for deduzido pedido cível, tendo o mesmo por fundamento um facto ilícito criminal, verificando-se o caso previsto no artigo 377.º, n.o 1, do Código de Processo Penal, ou seja, a absolvição do arguido, este só poderá ser condenado em indemnização civil se o pedido se fundar em responsabilidade extracontratual ou aquiliana, com exclusão da responsabilidade civil contratual.», tal não é, manifestamente, o caso.

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(19)

cfr. Figueiredo Dias, Direito Penal Português, As consequências jurídicas do crime, págs. 72-73.

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(20)

Idem, Ibidem, pág. 73.

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(21)

Que são os seguintes, complementados com os elementos constantes do CRC a fls. 218-2 os traços gerais que ficaram a constar do ponto 15p dos factos provados:

1) no proc no ---/97.3TALGS, o arguido foi condenado, por sentença proferida em 26/6/97 e transitada em 14/12/00, pela prática, em 4/10/97 de um crime de ofensa à integridade física, na pena de 100 dias de multa, extinta pelo cumprimento;

2) no proc no ---/04.4PALGS, o arguido foi condenado, por sentença proferida em 26/6/04 e transitada em 12/7/04, pela prática, em 25/6/04, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 120 dias de multa, extinta pelo cumprimento;

3) no proc no ----/03.8PALGS, o arguido foi condenado, por sentença proferida em 28/6/04 e transitada em 13/7/04, pela prática, em 3/8/03, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 50 dias de multa, extinta pelo cumprimento;

4) no proc no ---/05.9GALGS, o arguido foi condenado, por sentença proferida em 31/5/05 e transitada em 17/6/05, pela prática, em 4/5/05, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 5 meses de prisão, suspensa na sua execução por 2 anos com sujeição a deveres, extinta pelo cumprimento;

5) no proc no ---/09.1GALGS, o arguido foi condenado, por sentença proferida em 19/3/09 e transitada em 20/4/09, pela prática, em Fevereiro/09, de um crime de condução sem habilitação legal, na pena de 8 meses de prisão, suspensa na sua execução por 1 ano com sujeição a deveres.

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(22)

A título de exemplo, cfr. Acs. STJ 14/5/09, proc. no 19/08.3PSPRT:

"(...) na dimensão das finalidades da punição e da determinação em concreto da pena, as circunstâncias e os critérios do art. 71.º do CP têm a função de fornecer ao juiz módulos de vinculação na escolha da medida da pena; tais elementos e critérios devem contribuir tanto para co-determinar a medida adequada à finalidade de prevenção geral (a natureza e o grau de ilicitude do facto impõe maior ou menor conteúdo de prevenção geral, conforme tenham provocado maior ou menor sentimento comunitário de afectação dos valores) como para definir o nível e a premência das exigências de prevenção especial (as circunstâncias pessoais do agente, a idade, a confissão, o arrependimento), ao mesmo tempo que também transmitem indicações externas e objectivas para apreciar e avaliar a culpa do agente. Observados estes critérios de dosimetria concreta da pena, há uma margem de actuação do julgador dificilmente sindicável, se não mesmo impossível de sindicar.";

RP 2/6/10, proc. no 60/09.9GNPRT.P1:

"(...) no recurso dirigido à reacção penal aplicada, a pretensão recursiva apenas incidirá sobre os seus critérios fundamentais (culpa, prevenção especial ou geral) ou mesmos em relação às demais circunstâncias que rodearam o cometimento do crime, sejam pretéritas, contemporâneas ou posteriores a essa ocorrência, de tal modo que a pena aplicada se mostre inadequada quanto à escolha ou desajustada no que concerne ao seu quantitativo.

Nesta conformidade, esse desajustamento quantitativo terá que ser relevante, mostrando-se desproporcionado em função da culpa relevada ou das exigências de prevenção que se fazem sentir, impondo-se a sua correcção por via de recurso.

Mas já não passa pela precisão ou exactidão da reacção penal aplicada, definidos que estejam correctamente os respectivos parâmetros legais e judiciais, salvo, como já referimos, na falta de razoabilidade ou desproporcionalidade da reacção penal aplicada.

Assim, no recurso sobre a medida da pena o que poderá ser objecto do mesmo são a correcção dos critérios legais e judiciais de determinação da pena, de modo que seja aplicada uma reacção penal justa, mas não aquela pena exactamente justa."

e RE 30/9/14, proc. no 344/08.3GAOLH.E1 (em que a ora relatora interveio como adjunta):

"(...) os recursos (quer em matéria de facto, quer em matéria de direito) não são re-julgamentos da causa mas tão só remédios jurídicos.

Assim, também em matéria de pena, o recurso mantém o arquétipo de remédio jurídico.

Daqui resulta que o tribunal da Relação deve intervir na pena, alterando-a, tão só quando detecta incorrecções ou distorções no processo aplicativo desenvolvido em primeira instância, na interpretação ou aplicação das normas legais e constitucionais que regem a pena.

A Relação não decide da pena como se o fizesse ex novo, como se inexistisse decisão de 1ª instância. O recurso não visa, não pretende e não pode eliminar alguma margem de actuação, de apreciação livre, reconhecida ao tribunal de primeira instância enquanto componente individual do acto de julgar.

A sindicabilidade da pena em via de recurso situa-se, pois, na detecção de um desrespeito aos princípios que norteiam a pena ou de um desvio nas operações de determinação impostas por lei.

Daí que não abranja a determinação/fiscalização dum quantum exacto de pena que, decorrendo duma correcta aplicação das regras legais e dos princípios legais e constitucionais, ainda se revele proporcionado."

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(23)

Aliás como não poderia deixar de ser, desde logo porque posição diferente redundaria em desfavor do arguido, violando a proibição da reformatio in pejus.

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